segunda-feira, agosto 29, 2005

Me lembro de quando tive a estrelinha na minha mão. Me perguntavam o que era aquela luz, eu sorria calado, não precisava que eles soubessem, mas para que soubessem bastava que vissem o brilho bobo nos meus olhos. Então souberam. Mantive as mãos abertas o quanto pude, mesmo querendo segurá-la, mesmo querendo que ela ficasse para sempre, não a apertei muito. Não tinha a pretensão de ser dono de uma estrela.

Ela brilha sozinha, sem ninguém. Saiu voando pelo céu, a estrelinha, para brilhar na noite inteira, para todos os olhos. Ela também tem o poder de querer e não querer, mesmo sem saber direito disso. Ela pode sumir no horizonte e chorar no escuro, pode se esconder na luz do sol, que é maior, e passar um dia inteiro em silêncio, sem prestar atenção em nada, em ninguém, só nela mesma.

São coisas, enfim, que eu, aqui na penumbra, na janela, com minhas mãos ainda abertas, também preciso ouvir. A estrelinha, tão pequena, emitindo tanta luz para tantos olhos miúdos, deve se cansar de tantas explosões. Não se pode ter nas costas a responsabilidade de uma estrela. Ela, na verdade, é humana e tem que viver um pouco de música. Ela não precisa ser nada de mais, não precisa ser tão legal.

quinta-feira, agosto 18, 2005

Uma mulher, no primeiro instante parecia uma mulher, no segundo uma criança e foram só dois instantes. Me apertava bem forte, me segurando, e gritava no meu ouvido, em desespero, em pânico, antes de ser engolida pela escuridão: "Não vá embora!" Acordei assustado, soprava um vento frio, a porta de meu quarto estava aberta, depois dela uma escuridão ainda maior. A porta de meu quarto está com a mania de abrir-se sozinha, às 3 da manhã. Deve ser assombração.

"Assim você só engana a si mesmo." Diziam-me os pedagogos há quatrocentos anos. As idéias estão encontrando dificuldade de emergir dos ermos de minha mente para a tosca zona da consciência. Por isso nunca mais sonhos, por isso aquelas imagens confusas, aquela casa marrom-branca, cheia de colchões e pessoas dormindo, por isso a mulher grita.

Sentia frio, meu lado racional acordou e me levantei para fechar a porta. É preciso prestar mais atenção nas vozes. Há armadilhas em todo canto, não vejo o fundo do mar em que nado. Se a tal da força derrubará as barreiras, se o grito vai sair, se vou realizar a minha poesia... Se eu vou... Se eu vou.

quarta-feira, agosto 10, 2005

Atravessava a rua e vi no asfalto uma moeda. Peguei-a, bem velha e desgastada, 5 centavos, fora cunhada em 1997. 8 anos atrás. Eu tinha poucas preocupações, poucos amigos, ainda não tinha me interessado de verdade por mulher nenhuma. Quando criança eu fui de fato criança. Brincava com bola, fantasias, coisas inventadas, miniaturas e filmes ruins. Não gostava quando chegavam os meninos grandes com suas brincadeiras tacanhas de maltratar, suas histórias pornográficas mentirosas e seus métodos de conquista baratos. Cresci e continuei não gostando.

Joguei a moeda para cima, agarrei-a no ar e me vi Brás Cubas dizendo "É minha!". Mas não disse nada, porque eu não sei se é minha. Estou suspenso. Não aprendi em criança como se faz esses joguetes, cresci e continuei sem saber. Um sorriso ingênuo e franco, apenas. Em 1997 eu não precisava saber tantas coisas para ser feliz. Agora eu tenho hipóteses. As melhores e as piores me vêm à imaginação como caem as pétalas de uma flor, naquela brincadeira de advinhar os dias que virão, e parecem todas concretas no momento em que são advinhadas. Flores podem ter um número par ou ímpar de pétalas, isso fará toda a diferença.

Não posso ter tempo de pensar na proposta, na promessa que fiz, ora sábia, ora estúpida, mas que vou cumprir. Disseram-me então que eu não pensasse mais nessas coisas maravilhosas da vida. Que eu as esquecesse e me transformasse num objetivo, em detrimento do homem. Uma flecha sem mãos, olhos, nariz, boca: tudo que uma flecha tem é o seu alvo. Disseram-me que eu fosse uma flecha.

Não sou uma flecha. Sou um homem. A moeda voltará à circulação. Continuo suspenso. Aguardo. Estas são cenas para a próxima semana.

quarta-feira, agosto 03, 2005

Tarde de quarta-feira, céu claro e bonito, uma cerveja honesta na esquina e as conversas são mais fluentes do que o normal. Algumas verdades que nós normalmente escondemos num canto escuro do pensamento começam a aparecer: É algum tipo estranho de confiança que nos circunda nesses momentos, enquanto a tarde passa e nos esquecemos de nossas responsabilidades. Enquanto somos um pouco felizes.

O tempo que esteve passando, este não me pareceu perdido. Não. O movimento de lá para cá das pessoas me deu gosto de vida. Eu gosto deste mar, deste céu redondo, da linha do horizonte entre eles. Eu gosto deste lugar. E é tanto esforço para conseguir mais um problema, uma saudade daquelas que fazem chorar baixinho. Eu não tenho mais tanta certeza. Estou pensando no assunto. Há marcas do copo em vários pontos da mesa. Profusão.

As pessoas passando e eu querendo que uma delas seja ela. Querendo encontrá-la numa daquelas coincidências mágicas de que ela tanto gosta. Mas sei que nos dias de semana estamos em lugares muito diferentes. Dias inúteis. Artistas tristes cantam no meu ouvido enquanto vou para casa. Descanso. Sono. Quero logo o amanhã... Quero ser um pouco feliz.