sábado, dezembro 31, 2005

Foi o ano mais feliz, também o mais triste. O mais difícil, mais cheio de superações. Uma jornada profunda de auto-conhecimento, em busca da simplicidade.

É isso.

quarta-feira, dezembro 28, 2005

Eu não posso. Eu não consigo. Desculpe.

sexta-feira, dezembro 23, 2005

"Respeito muito as minhas lágrimas, mas ainda mais minha risada."
(Caetano)

terça-feira, dezembro 13, 2005

Não cuido bem do meu coração. Como se ele fosse eterno e pudesse resistir a tudo, eu me arrisco. Simpatia pelo perigo, desejo pelo risco, a adrenalina que precede o choque com o chão frio. Sou corajoso, temerário - ou simplesmente covarde demais para ser racional e desistir...

A minha tristeza continuou tristeza. Tomar cerveja e lamentar, um pouco, olhando o céu escuro, meu melhor amigo. Existe nisso algum prazer, alguma beleza, alguma glória em chorar. Sinto na minha lágrima o meu próprio perdão. Minha voz me dizendo:

- Sim, tudo bem, você é fraco, você comete erros e sua vida não é perfeita, como qualquer ser humano, como qualquer um que está vivo e em movimento. Chora. Chora e perdoa a ti mesmo.

quinta-feira, dezembro 08, 2005

Há diferenças e certas poucas semelhanças que são inconsistentes com a amizade. Porque o mundo é pequeno, mas pode-se andar sobre ele eternamente sem repetir um único momento, mesmo que repitam-se os lugares e que as histórias sejam muito parecidas.

Neste momento minhas qualidades parecem trapaças vis e as suas, virtudes. Minhas mentiras parecem execráveis e as suas, apenas saudáveis segredos.

Todos temos nossas contradições.

Eu tenho um paradoxo.

domingo, dezembro 04, 2005

Nada. Eu ia escrever sobre a solidão de novo.

A vida, olhando de longe, é engraçada.

segunda-feira, novembro 28, 2005

Apesar do céu claro acima das núvens, que eu via da janelinha do avião, lá embaixo, na cidade, já era noite. Um miriápode de luzes vermelhas indo, outro de luzes brancas vindo.

São Paulo.

sábado, novembro 26, 2005

Estamos todos sós. Na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, até que a morte nos reúna.

Tenho um desejo mordido e frustrado de me comunicar. Hoje me deu medo de estar só. Um só não tem do quê se esconder, pode chorar e eu tive medo de chorar. Então corri, saí de casa em busca de companhia, para me deleitar na ilusão da companhia. Ilusão achar que existe alguém com a gente em momento algum, mas eu quis acreditar, quis beber daquele copo e fugir da inevitável verdade: ninguém se ouve, ninguém quer se entender, ninguém se enxerga além do que já tem nos olhos.

Não bastam palavras. Quando eu estiver sem caneta e papel, nem nada, e surgir um verso lindo, este verso eu não posso escrever ou memorizar. Leio-o da minha mente em voz alta, para que ele ressone nas paredes do meu quarto, e para que eu o viva num momento. Sei que, de qualquer forma, ele é só meu.

Trancado no meu quarto, não tenho de quem me esconder, posso chorar. E tenho medo.

domingo, novembro 13, 2005

Eu gosto mais das coisas sutis. Pequenas, mas enormes. O movimento dos pés embaixo da mesa, o modo de segurar o copo, a orquestra dos músculos do rosto, a coreografia dos olhos. Dizem. O que já virou palavra e som são cartas na mesa, já jogadas, não me interessam. O que é explícito é de todos e não diferencia nada de nada, o não dito é infinitamente mais importante. O que é silencioso tem um assunto próprio.

Cavalos marcados fugidos pastam na praça.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Outro dia deitei na rede e vi a lua cheia na mesma posição. Não sei de datas, dessas marcações mundanas do tempo, mas eu soube que fazia um ciclo de lua desde aquele momento tão feliz. Andava hoje pelo dia de sol, céu azul puro e virei para cima as palmas das mãos. O calor se concentra nas palmas das minhas mãos e eu tenho energias para tudo. Hoje existe o silêncio.

Um silêncio denso, no ar, apesar dos barulhos dos carros correndo, dos livros caindo das mãos descuidadas, da risada da criança, do rádio tocando música ruim, dos passos rápidos, dos carros freando. Silêncio difícil de quebrar, que se extende e se extenua à medida em que se extende. Cada minuto sem a uma voz e o ar pesa mais. Existe a vontade do grito, o direito ao grito, mas o temor ao silêncio.

Existe a saudade do silêncio harmonioso que havia quando os olhos se olhavam, um pouco encabulados um do outro, um pouco sem saber, mas com a confiança suficiente para eliminar a necessidade de palavras. Outro dia, fez um ciclo de lua. Hoje tenho o calor do sol se concentrando em minhas mãos, pois preciso de energias para prosseguir no caminho de viver.

Eu grito para dentro. Este silêncio que há agora carece de palavras.

quinta-feira, outubro 20, 2005

Três. O número três me assombra. Não conheço numerologias, mas se fosse minha responsabilidade escolher, diria sem hesitar: é o três o número da traição, do conchavo, das mais vis conspirações. Atribuiria também ao três a solidão, a miséria de um só - mas que o três ratifica. Pois que entre dois pontos se desenha uma linha reta, mas três se comunicam num triângulo, de modo que não há um trio de pontos unidos, mas sim três pares de pontos ligados por três linhas. E sabe-se que uma linha é só ela, absoluta e imponente. Três linhas têm, duas a duas, suas diferenças, suas comparações, suas distâncias.

Extende-se então este raciocínio, que até agora foi meramente geométrico, às relações humanas, sejam elas de amizade, amor ou até ódio. Suponhamos três amigos. Fica claro que não surge entre eles uma amizade trina, localizada no baricentro do triângulo. Óbvio que não. Cada um se relaciona separadamente com os outros dois, por mais que se considerem um grupo unido. Haverá conversas particulares em que a postura do terceiro em uma dada situação será criticada, em que as desavenças serão expostas.

Quando encontrarem-se novamente os três, existirá cumplicidade entre dois em detrimento de um terceiro. Três desmembram-se em dois cúmplices e uma solitária vítima do escárnio, da crítica, da exclusão e até da mentira. Sendo assim, cada um dos três aspira à posição de cúmplice quando é vítima, estando em cada momento dois alegres e um não.

Pensando bem, a palavra ?cúmplice? presume a existência de um crime.

quinta-feira, outubro 06, 2005

É. Como quando estamos tristes e ficamos olhando, um pouco sem olhar, para nossas mãos enquanto brincamos com algum objeto, tentando girar a caneta em torno de sua ponta, ou equilibrar um molho de chaves numa posição bizarra qualquer. E se a chave desequilibra e cai, a gente chora, porque o pensamento estava longe, tão longe...

terça-feira, outubro 04, 2005

Vem, vai e volta. Vai e volta. Já há sorrisos sinceros no meu rosto, apesar de ainda haver também lágrimas. Foi muito brusco, muito de repente - apesar de não ter sido inseperado. Eu estava em estado de choque, tendo que assimilar assim, de uma vez, tanta informação. Parecia, então, tudo caótico, nada confiável, o chão se abriu e eu caí. Não tenho asas, sou humano.

Aos 17 anos eu acreditava ser imortal. Deixei de sê-lo simplesmente porque deixei de acreditar. Chovia em mim.

Já consigo me lembrar com alegria do que aconteceu. Penso que valeu a pena. Que fiz muito bem em olhar para cima pra ver quem vinha, pouco mais de 2 anos atrás. Já durmo bem às noites. Já tenho um pouco de minha tranquilidade, serenidade, de volta. São coisas que acontecem com quem está vivo.

Quero paz entre nós.

domingo, outubro 02, 2005

Estas lágrimas são só minhas. Ninguém pode secar com um lenço, que virão mais. Ninguém pode me consolar nem dizer nada que vá mudar alguma coisa. Ninguém pode me entender. Quem chora sempre está sozinho. Acordado à noite inteira, chorando mais às 7 da manhã, às 2 da tarde, muito. "A tristeza é uma alegria falhada." (Clarice Lispector). O quanto eu choro mostra o tamanho da alegria que falhou.

Sorte e azar. Ou será uma questão de competência? Me sinto mesmo, agora, um incompentente. Não consigo parar de pensar que tem um outro lá, no meu lugar - que aliás não é mais meu - e que este outro foi, de algum jeito, mais interessante que eu. E o que eu vou fazer? Me adaptar? Me transformar numa dessas pessoas de que o mundo gosta? Numa dessas pessoas que a felicidade agracia?

Dói demais. Sinto saudades das alegrias que tive. Saudades dela, de tudo nela. De como ela é uma pessoa incrível e apaixonante, de como me dava vontade de pegar e beijar todas as partes de seu corpo. "Seus pelos, seu gosto, seu rosto, tudo o que não me deixa em paz." (Herbert Vianna) Como é que eu vou desistir? Como é que eu vou deixar de amar alguém assim?

Me diz.

quarta-feira, setembro 28, 2005

Esta é a voz de um homem amargurado. Deixado e trocado. O homem aqui, eu, vou falar de amor. O amor não é lindo. O amor não é tudo de que precisamos. O amor não vence sempre no final. O amor só às vezes dá uma sorte e essa sorte não seu deu comigo. Eu persisti bastante, heroicamente, mas chega um ponto em que, mesmo para um herói, é mais digno desistir. Digno e cruel, pois não está o fracasso na derrota, mas sim na desistência.

E eu só consigo pensar que sou eu o fracasso. Fui eu que mergulhei de cabeça nessa aventura insana. O mundo é mesmo cruel, algumas pessoas ficam de fora, algumas pessoas não foram feitas para a vida. Não quero ouvir nenhuma música. Meu coração precisa endurecer. Entender que aquela esperança toda é por coisa que não existe. Tem outro lá dizendo que não, que é tudo lindo do lugar de onde ele vê. Isso tudo dói.

Existem mesmo pessoas com outros conceitos, as que tiveram só experiências bonitas. Hoje eu pensei não queria que nada disso tivesse acontecido, nada mesmo, desde o começo mesmo. Que naquele dia eu não tivesse levantado a cabeça pra olhar quem vinha. Não me importa a carga de aprendizagem que veio com a minha experiência desagradável. É só muito sofrimento. Infelicidade.

E se eu daqui a uns dias disser que estou bem, será mentira. Se eu disser que vi o pôr-do-sol e fiquei feliz, será mentira. Até se eu viajar pra Europa e disser que lá é tudo lindo e está sendo uma viagem maravilhosa, será mentira. E no natal, quando eu estiver tocando violão com minha família, quando eu sorrir, será mentira. Se eu passar na UNICAMP e for comemorar, será mentira. Infelicidade.

Esse texto é mesmo feio.
Foda-se o poder criativo da dor.

segunda-feira, setembro 26, 2005

Já falei das cores do céu. Eu gosto tanto do céu... Faz uma tarde linda, hoje. Gosto do vento me acariciando, tranquilizando minha cabeça, mexendo nos meus cabelos. Gosto do sol depois das três, do calor carinhoso que vem no meu rosto, nas minhas mãos, da cor bonita que ele faz e que dá a tudo e tudo mesmo fica bonito. Gosto de andar no Rio Vermelho no fim da tarde e ver os barcos de pescadores chegando, as andorinhas beliscando o mar, o mar no seu balanço calmo e eterno.

Tenho um andar sereno, que vai devagar, olhando para tudo com olhos novos a cada passo, procurando beleza e enquadrando várias imagens na minha memória. Tenho uma admiração pela beleza das mulheres que vai além das coisas mundanas, que transcende qualquer limite, porque elas têm beleza não só em seus rostos, mas na forma como vivem, como soriem, o sol e a lua lhes agraciam.

Sou muito paciente, porque o tempo para mim não se mede em horas e minutos, mas simplesmente não se mede, o tempo é uma coisa muito diferente. Eu sei esperar sentado em minha posição confortável, com minha expressão pensativa e longíncua, do outro lado da rua, ou da terra, ou da lua. Enfim... Eu deito na rede e olho para o céu, já falei das cores do céu. Sou pitoresco. Sou baiano.

quarta-feira, setembro 21, 2005

Um estranho, eu. Não me reconheço no espelho, no vidro do ônibus, minha cabeça encostada, vento do mar no meu rosto, mais na frente um menino sentia o prazer deste vento e queria sorrir, estava num tempo sem refletir. Eu não me reconhecia e no engarrafamento parou de ventar tão bem. Olhos para baixo, minhas mãos nervosas se mexendo sem motivo. Sem propósito.

Como é que vou escolher o que fazer, se nem sei o que quero, onde eu quero chegar com isso tudo? Não posso parar para pensar agora, senão eu destruo minhas opções. fecho meus caminhos e caio num buraco mais razo que minha altura, onde não poderei nem me esconder. O que está acontecendo? Isso tudo foi inesperado, isso tudo hoje. Não sei e não devo ficar advinhando as coisas, ambigüidades podem incomodar desavisados. Deixo claro que já acordei assim.

Não entendo meu próprio olhar no espelho, no vidro do ônibus. Só sabia que queria chegar em casa e poder parar as pernas, fechava os olhos no caminho e quase dormia durante a caminhada. Cansado e sujo. Enquanto tomava banho, aproveitei a água caindo no meu rosto e chorei, sem nem saber porquê.

segunda-feira, setembro 19, 2005

Tenho sono. Essas pessoas me ensinando meias-verdades sobre o mundo, sobre a ciência... Essas pessoas me cansam. Mas alguma coisa, algum barulho agudo e irritante que vem de dentro de mim não me deixa dormir. Estou em estado de alerta, não posso perder nenhuma informação que passa por mim. Relações numéricas, onde está o ouro do país, o que fazem as bactérias, porque o sol é quente.

Uma rede na minha varanda, pássaros, núvens, aviões. Eu sou baiano, há quem diga que o tempo aqui não passa. Eu gosto tanto daqui... Hoje, escrever também me cansa.

quarta-feira, setembro 14, 2005

Poesia de Bêbado:

Este é o beco dos excomungados
Dos que, em algum ponto, se perderam
Erraram o caminho e não sabem a volta
Os escorados, execrados, mal-vistos

Estão todos aqui, onde aos pouco se matam
Um recurso comum, um clichê barato
Estão aqui os que não querem lutar
Os que se entregam às terças de tarde

Nós, no beco, inalamos a fumaça
Nós que tivemos medo e nos escondemos
Estamos só perdendo nosso tempo
Os bancos são sujos de nossa vergonha

Ter fugido é mesmo uma vergonha
Eu sei, eu sei, é tudo pequeno
Mais uma garrafa e eu termino o poema

Eis aqui o canto dos viciados
Os que não sabem o que querem
Aqui ninguém precisa ter certeza
Todos nós já estamos errados

Eis aqui o canto dos viciados
Os que não sabem a hora
Aqui ninguém precisa ter razão
Todos nós já nascemos errados

Nossos versos são ruins.
Nossa poesia é de bêbado.
Nós não sabemos o que é a vida.

segunda-feira, agosto 29, 2005

Me lembro de quando tive a estrelinha na minha mão. Me perguntavam o que era aquela luz, eu sorria calado, não precisava que eles soubessem, mas para que soubessem bastava que vissem o brilho bobo nos meus olhos. Então souberam. Mantive as mãos abertas o quanto pude, mesmo querendo segurá-la, mesmo querendo que ela ficasse para sempre, não a apertei muito. Não tinha a pretensão de ser dono de uma estrela.

Ela brilha sozinha, sem ninguém. Saiu voando pelo céu, a estrelinha, para brilhar na noite inteira, para todos os olhos. Ela também tem o poder de querer e não querer, mesmo sem saber direito disso. Ela pode sumir no horizonte e chorar no escuro, pode se esconder na luz do sol, que é maior, e passar um dia inteiro em silêncio, sem prestar atenção em nada, em ninguém, só nela mesma.

São coisas, enfim, que eu, aqui na penumbra, na janela, com minhas mãos ainda abertas, também preciso ouvir. A estrelinha, tão pequena, emitindo tanta luz para tantos olhos miúdos, deve se cansar de tantas explosões. Não se pode ter nas costas a responsabilidade de uma estrela. Ela, na verdade, é humana e tem que viver um pouco de música. Ela não precisa ser nada de mais, não precisa ser tão legal.

quinta-feira, agosto 18, 2005

Uma mulher, no primeiro instante parecia uma mulher, no segundo uma criança e foram só dois instantes. Me apertava bem forte, me segurando, e gritava no meu ouvido, em desespero, em pânico, antes de ser engolida pela escuridão: "Não vá embora!" Acordei assustado, soprava um vento frio, a porta de meu quarto estava aberta, depois dela uma escuridão ainda maior. A porta de meu quarto está com a mania de abrir-se sozinha, às 3 da manhã. Deve ser assombração.

"Assim você só engana a si mesmo." Diziam-me os pedagogos há quatrocentos anos. As idéias estão encontrando dificuldade de emergir dos ermos de minha mente para a tosca zona da consciência. Por isso nunca mais sonhos, por isso aquelas imagens confusas, aquela casa marrom-branca, cheia de colchões e pessoas dormindo, por isso a mulher grita.

Sentia frio, meu lado racional acordou e me levantei para fechar a porta. É preciso prestar mais atenção nas vozes. Há armadilhas em todo canto, não vejo o fundo do mar em que nado. Se a tal da força derrubará as barreiras, se o grito vai sair, se vou realizar a minha poesia... Se eu vou... Se eu vou.

quarta-feira, agosto 10, 2005

Atravessava a rua e vi no asfalto uma moeda. Peguei-a, bem velha e desgastada, 5 centavos, fora cunhada em 1997. 8 anos atrás. Eu tinha poucas preocupações, poucos amigos, ainda não tinha me interessado de verdade por mulher nenhuma. Quando criança eu fui de fato criança. Brincava com bola, fantasias, coisas inventadas, miniaturas e filmes ruins. Não gostava quando chegavam os meninos grandes com suas brincadeiras tacanhas de maltratar, suas histórias pornográficas mentirosas e seus métodos de conquista baratos. Cresci e continuei não gostando.

Joguei a moeda para cima, agarrei-a no ar e me vi Brás Cubas dizendo "É minha!". Mas não disse nada, porque eu não sei se é minha. Estou suspenso. Não aprendi em criança como se faz esses joguetes, cresci e continuei sem saber. Um sorriso ingênuo e franco, apenas. Em 1997 eu não precisava saber tantas coisas para ser feliz. Agora eu tenho hipóteses. As melhores e as piores me vêm à imaginação como caem as pétalas de uma flor, naquela brincadeira de advinhar os dias que virão, e parecem todas concretas no momento em que são advinhadas. Flores podem ter um número par ou ímpar de pétalas, isso fará toda a diferença.

Não posso ter tempo de pensar na proposta, na promessa que fiz, ora sábia, ora estúpida, mas que vou cumprir. Disseram-me então que eu não pensasse mais nessas coisas maravilhosas da vida. Que eu as esquecesse e me transformasse num objetivo, em detrimento do homem. Uma flecha sem mãos, olhos, nariz, boca: tudo que uma flecha tem é o seu alvo. Disseram-me que eu fosse uma flecha.

Não sou uma flecha. Sou um homem. A moeda voltará à circulação. Continuo suspenso. Aguardo. Estas são cenas para a próxima semana.

quarta-feira, agosto 03, 2005

Tarde de quarta-feira, céu claro e bonito, uma cerveja honesta na esquina e as conversas são mais fluentes do que o normal. Algumas verdades que nós normalmente escondemos num canto escuro do pensamento começam a aparecer: É algum tipo estranho de confiança que nos circunda nesses momentos, enquanto a tarde passa e nos esquecemos de nossas responsabilidades. Enquanto somos um pouco felizes.

O tempo que esteve passando, este não me pareceu perdido. Não. O movimento de lá para cá das pessoas me deu gosto de vida. Eu gosto deste mar, deste céu redondo, da linha do horizonte entre eles. Eu gosto deste lugar. E é tanto esforço para conseguir mais um problema, uma saudade daquelas que fazem chorar baixinho. Eu não tenho mais tanta certeza. Estou pensando no assunto. Há marcas do copo em vários pontos da mesa. Profusão.

As pessoas passando e eu querendo que uma delas seja ela. Querendo encontrá-la numa daquelas coincidências mágicas de que ela tanto gosta. Mas sei que nos dias de semana estamos em lugares muito diferentes. Dias inúteis. Artistas tristes cantam no meu ouvido enquanto vou para casa. Descanso. Sono. Quero logo o amanhã... Quero ser um pouco feliz.

quarta-feira, julho 27, 2005

É só um chuvisco, mas toda tempestade começa com uma gota d'água. Sinto o vento feito do frio que sobrou da noite quando saio de casa às seis da manhã, fazer para mim um dia novo. Uma aura de sons psicodélicos me protegendo dos barulhos feios que os carros fazem, que as pessoas fazem. Mãos no bolso. Evito olhares. Tenho medo de ter os meus sapatos.

Sinceramente, eu entendo, sim. Eu realmente pensei no que estou falando. O céu vai mudando de cor devagar. Meus olhos transitam entre as frases, meio perdidos nas esquinas, nas vírgulas, nos cruzamentos. Estou indo para onde, mesmo? Os livros. Não, os livros não mudam de cor. Está passando um rapaz numa bicicleta amarela, embaixo do céu. Uma dessas luzes acesas, aqui em cima, é a minha janela.Olha...

As luzes dos prédios como um míope, nú, as vê. Este é um recado completo. A diferença não está em um número, é algo complexo, a óptica explica em seus livros estáticos, imóveis, sobre os quais tenho que me debruçar enquanto, na verdade, filosofo sobre a brancura inerte do teto. Um inseto circunda a lâmpada. Se protege da chuva.

O pior já passou, lá fora é só um chuvisco. Toda tempestade termina com uma gota d'água.

quarta-feira, julho 13, 2005

Não enxergo muito bem os papéis que me dão, o teatro chora ao invés de rir. Falta ao ator uma peça. Tragédia, pessoas fazendo papeís de ávores, fileiras de eucaliptos. Passa por esta Terra um roteiro. Ando a me preocupar, o mundo é um lugar perigoso. É preciso ter muito cuidado: no escuro, substâncias isômeras podem nos confundir.

Aplausos. Foi uma excelente exposição, agora treino o preenchimento de lacunas em papéis. No final disso tudo testaremos nossas competências... Talvez haja alguma referência literária na minha vida, talvez eu me transforme numa citação, talvez me perguntem sobre isso. O público não quer que as respostas lhe sejam dadas assim, tão objetivamente e há nisso alguma beleza. Já estou embaixo deste teto há muito tempo.

Dou ao céu um voto de confiança, que não haja mais precipitações hoje. O teatro se preenche de cadeiras vazias, silêncio e escuridão. O roteiro que sigo até a minha casa é cheio de lacunas, as ruas são cheias de domingos, mas não enxergo muito bem. Olho para trás a procura de algo de memorável, é preciso ter muito cuidado: nos meus olhos, as lágrimas de alegria e de dor podem se confundir.

quarta-feira, julho 06, 2005

Senhoras se incomodam com minha presença intrusiva no espelho do elevador. Desconheço o tema sobre o qual elas conversam, meus fones de ouvido, ainda bem, me impedem, tocando um hardcore que mal entendo, mas pelas palavras que pesco, está ofendendo os parentes das pessoas ricas, como aquelas senhoras. Não quero ouvir papos chatos sobre farinha de trigo, netos que não dão trabalho e lugares onde se encontra roupas bonitas e mais baratas. Estou longe delas. A física é capaz de medir distâncias atrás de espelhos.

Cálculos duvidosos que eu aprendo às sete horas da manhã e em que fico pensando quando subo o elevador com senhoras que olham estranho. Quarto andar, boa noite. Sozinho com as ofensas gratuitas nos meus fones de ouvido. Sei pela minha experiência, faltam seis segundos para que eu chegue em casa, talvez a fechadura resista um pouco, ela precisa de algum tipo de conserto ou óleo lubrificante.

Óleo para o deslize. Um deslize e parlamentares em pânico se ofendem muito mais que os cantores raivosos que já desliguei, mais sons mecânicos, mais ofensas - dessa vez não são gratuitas, mas pagas e muito caras. Questão de ordem. Prefiro ficar distante dentro do espelho. Som harmônico do meu violão se propaga segundo as leis da física, não penso mais nisso.

segunda-feira, junho 20, 2005

Andava pelas ruas, pelo asfalto mesmo, esperando a hora certa de atravessar a rua. Vi um trator. Daqueles de carregar terra de um monte de terra e jogar num caminhão, mas o trator estava derrubando uma casa. Surreal. Com frieza, o monstro desferia os seus golpes desleais, a casa ia caindo, a histórias iam caindo e se despedaçava uma parede que tinha marcas de mãos a menos de um metro de altura. Cresceria alguém naquela casa, agora, vai crescer um prédio.

E no prédio, cem crianças vão crescer brincando no parquinho cercado e seguro. Aprenderão a jogar futebol, uns com os outros, numa quadra daquelas poliesportivas envolvidas por uma cerca verde, porque sempre escolhem verde, da mesma forma que nas piscinas o cercado é sempre azul e os azulejos azuis-claro. No fundo da piscina, um menino, eventualmente, vai bater o dente. Ele vai ficar com ciúmes quando seu vizinho e melhor amigo trouxer a turma da escola para o seu aniversário e não lhe der muita atenção. Sempre acontece.

Eu passava pela casa quase todos os dias, era bonita, era amarela e tinham três potes de flores vermelhas muito bem cuidadas. Passarei agora por uma construção onde diversos homens feios com fardas de construtora (que também costumam ser azuis) carregarão vergalhões, ferramentas e carrinhos de mão cheios de terra, numa sinfonia de barulhos desagradáveis. Em prol das cem crianças que vão chegar alguns mêses depois, para brincar no parquinho, jogar futebol, quebrar dentes no fundo da piscina e fazerem amizades.

O trator que derrubou a casa não era um trator de derrubar casas.

sexta-feira, junho 17, 2005

terça-feira, junho 14, 2005

"Este rumor monótono de conversa, estes odores misturados, as feições que se desarrumam e se deslocam no ato de falar atordoame-me: não conheço ninguém, não possuo o hábito destes templos exóticos em que se sacrificam não já víscerass de aniamis, mas o próprio fígado, modernas catacumbas a que as lâmpadas votivas das luzes raras e o murmúrio de reza das conversas conferem uma tonalidade de religião sacrílega de que o barman é o bezerro de ouro, imóvel, atrás do altar-mor do balcão, cerdado pelos diáconos dos frequentadores do costume, que ereguem em seu louvor black-velvet rituais."

António Lobo Antunes, em Os Cus de Judas.

Eu amo a noite.

segunda-feira, junho 06, 2005

Deixa eu ficar quieto com meu violão, tocando baixinho e cantando esta música triste. Eu quero. Deixa eu sofrer e chorar um pouquinho, hoje, não vou deixar pra lá. Deixa eu ficar chateado, eu preciso sentir um pouco disso. Não vou ser aquele homem forte, não vou passar por cima, não vou lidar bem com a situação. Desculpe, mas vou me sentar lá longe, no cantinho.

Não me console. Não me diga que essas coisas acontecem com qualquer um. Aconteceram comigo, eu trouxe isso tudo para mim, eu trago isso tudo na minha bagagem. Eu sei que acontecem. Não me olhe com esses lindos olhos. Os meus olhos, agora, são de lágrimas e querem ver o mundo de longe.

Não me pergunte. Não pergunte aos outros, os outros não sabem. É só um momento necessário. Um sorvete, agora, não vai me alegrar. É só um pouco de paz e de silêncio...

sexta-feira, junho 03, 2005

Não é culpa de ninguém. Sou eu mesmo quem me destruo, mesmo tendo sido eu mesmo quem construiu tudo. Fui eu mesmo que construí aquela ponte enorme e depois, quando choveu, fui eu, o próprio, que voltei para minha cabana para me aconchegar em minha rotina morna. Nem quente nem fria.

Eu estava já indo embora. Consegui por alguns instantes me soltar, aproveitei e corri o máximo que pude. Me molhava, mas corria, era um grande risco, mas corria. Estava quase chegando lá, mas fui capturado e envenenado novamente. Veneno. Não podia mais ver com clareza, meus olhos aos poucos se fecharam, dormi. Dormi e o sono foi tão profundo que não ouvi os chamados.

Fui eu quem tropeçou ali. Agora que passou, só consigo advinhar o que perdi, advinho alto, advinho muito, advinho muita alegria. Só consigo, então, me sentir idiota. Só consigo perceber o quanto isto se repete todos os dias, o quanto estou perdendo nesta farsa-tragédia. Não é culpa de ninguém, e em ninguém eu me transformo.

terça-feira, maio 24, 2005

O The Bends e os dias chuvosos me lembram Paris. Tardes cinzentas de terça-feira de inverno, a cidade em algum tipo inóspito de ebulição fria e eu andava sem saber por onde, escolhia aleatoriamente minha direção e era beleza brotando de todos os lados. Não há um dia sequer em minha vida em que eu não tenha a memória de uma dessas terças-feiras cinzentas.

Hoje, minha também linda Salvador, terça-feira cinzenta, The Bends, uma sinusite deixando o ar ainda mais denso... Sensação de que estou em outro lugar, não aqui. Estou voando... Flutuando. Estresso ainda mais a minha garganta cantando. É, eu sei que não deveria, mas não há nada que eu possa fazer, a música me controla. It's the best thing.

Eu tenho fantasias musicais... Eu via as mulheres lindas de Paris, vejo as mulheres lindas daqui, de qualquer lugar, e me pergunto: Qual será o tom de sua voz? Como ela interpretaria Black Star? Ela faz que gestos quando canta? Um dia quero que você cante ao som do meu violão... Que tal? Que tal? Um dia quero formar uma banda com você... Nossas vozes se combinarão, você vai ver... Vai ser perfeito.

E eu, por enquanto, fico no meu quarto sonhando enquanto toco sozinho.

segunda-feira, maio 09, 2005

É complicado dizer como as coisas vão... Eu nunca gostei mesmo muito disso. Frases bonitas não ficam mais passeando pela minha cabeça. Procuro alguns fantasmas na gaveta... Livros didáticos em cima da cama, nenhum corpo humano vivo respirando. Acho que estou reclamando demais do que não é tão ruim... É só uma coisa que eu odeio fazer. E tenho que fazer. E depois da pedra tem mais caminho.

"Não, eu vou bem, e você? Quando é que a gente vai se ver?"

Quisera eu saber.

terça-feira, abril 26, 2005

Canto para o céu escuro e as janelas do meu bairro parecem todas me ouvir. Variações multicoloridas, quase todas iguais, vindas dos apartamentos. Canais de TV. Há também os grilos do parque da cidade. Ouço os grilos, ouço minha voz, ouço meu violão, ouço o balançar da mesa e da garrafa de vinho enquanto escrevo. As janelas do meu bairro parecem me ouvir.

Vinho e água gelada. Estou feliz agora. O agora é bom. Estou só, sou só... eu, violão, pinot noir, caneta, papel: consigo escrever sem pensar muito. Um gole, uma música, um gole, uma frase. Leio em voz alta. Sei que outras varandas podem me ouvir. No fundo, tenho esperança que em alguma delas, alguém ouça. Tenho esperanças.

Que eu me desconfigure. Que os ouvidos das janelas se desconfigurem. Que meus olhos vejam a nova figura e, do nada, eu me faça alguém. Estas palavras têm significado, estão escritas num papel, estão ditas ao céu escuro e as janelas parecem me ouvir.

domingo, abril 10, 2005

Ontem eu menti para um motorista de táxi. Me senti ridículo. Voltava para casa às 3 horas da manhã, "minha namorada não pôde vir.", sozinho. Voltava pra casa sozinho e é isse que sou hoje. Entre amigos e metáforas alcóolicas, apenas, e sempre vagando por aí com as minhas verdades perturbadoras. Eu curti a ilusão do trajeto, mas mentir me dói.

Estou tão fraco que precisei me fingir de bom. Precisei ficar por cima em pelo menos um diálogo, pelo menos uma vez não falar de ser só e só saber sê-lo. Agora eu tenho vergonha disso tudo, e é por ter vergonha que eu mostro isso aqui. Para que as pessoas saibam e me critiquem, mas que eu possa dizer-me já ciente da contradição.

Tento derrubar minhas máscaras e ser eu, mostrar eu, aparentar eu, dar a perceber eu (E quem é Eu?). É muito mais fácil fazer isso com um motorista de táxi às 3 horas da manhã do que com minha família, com meus amigos...Eu sofro por ter que me fingir de bom, de tão ruim que sou, pra manter a convivência... Concessões. Concessões para mim têm gosto de mentira...

E é às pessoas que eu mais amo que tenho de conceder.

sexta-feira, março 25, 2005

Sonho - 24 a 25 de Março de 2005

O lugar é cinza, todo monocromático. Não sei se é um muro, um prédio... Há o asfalto, a calçada, o muro em ruínas, um banco de concreto. É uma parada de ônibus. Lá está um menino de uns 10 anos. Usa uma calça jeans, uma camisa polo azul, como se tivesse sido vestido pela mãe, e senta no cantinho do banco ele tem uma expressão triste e séria. Converso algumas coisas com ele e percebo que o menino é muito inteligente e maduro. Quando digo isso, ele só abaixa a cabeça, consentindo, e fica calado.

Não me lembro exatamente os assuntos sobre os quais conversávamos. Algo sobre os adultos, eu acho. O menino estava esperando um ônibus e sentava bem no canto do banco, meio arqueado, olhando pra baixo. Faço algumas gracinhas, palhaçadas, mas o menino não ri. Ele olha pra mim com um certo desprezo, até, como quem diz "não seja idiota".

Converso mais com ele. O menino é muito bonito. Me abaixo diante dele. Já estou quase acordando, já estou ciente de minha posição na cama, de alguns sons ao meu redor. Olho para o menino e pergunto, quase já certo da resposta: Quem é você, menino?

domingo, março 20, 2005

Hoje não há palavras. O silêncio é minha metáfora.

segunda-feira, março 14, 2005

Triste. Pensando em tudo que tenho que deixar pra trás quando sigo em frente... Tudo que está acontecendo ao meu redor, sem mim. O mundo que continua o mesmo, independente de minha ausência, inconsciente de quem eu sou, onde estou, o que estou fazendo... E o que eu estou fazendo? Dando outro passo, outro passo, outro passo, subindo um degrau, outro degrau, mais acima, mais adentro na gruta à espera de uma gota d'água.

Do lado de fora, uma tempestade. Um grito de pânico. Quero sair! Quero sair! Me molhar, sentir o vento, a noite, as alucinações do vício de viver! Ah, tentação! Meu caminho difícil por si só já será uma prova, antes da outra literal. Ainda é o começo da longa estrada, mas as provações já são diversas. Eis o meu momento de fraqueza: amigos comendo pizza longe daqui.

E a cada dia tenho que procurar um novo incentivo pra me levantar. Cada dia eu consigo. Cada vez que bate aquele sono, preciso de uma razão pra continuar sobre todos aqueles livros. Cada vez eu consigo. É muita coisa que tenho que deixar pra trás quando sigo em frente. O sacrifício parece fazer sentido.

quarta-feira, março 02, 2005

Nasce o sol, atinge a altura de minha janela, bate no meu rosto, meus olhos... Abrem-se. Ainda falta um pouco para o despertador tocar... Ainda tenho sono para mais que isso, mas azar, são as obrigações... Não... São os sacrifícios que tenho que fazer para alcançar o que eu quero. Agora é livre. Uma questão de escolha. Uma questão de comparar o sonho com a preguiça, como já ouvi por aí. O sonho que eu tenho acordado com o que eu posso ter dormindo.

Mas é tão difícil levantar... Tão difícil me soltar dos cobertores, desencostar a cabeça do travesseiro e encostar o pé no chão. Andar em direção ao chuveiro e tomar água fria na cara. É tão difícil acordar e perceber que é mais um dia vindo aí, que eu tenho que começar a me movimentar, se não vai chegar a noite e não haverá cansaço, nem calos nos pés, nem pegada atrás de mim, nem caminho à frente, nem sucesso.

O pouco tempo passou e o despertador toca, agora. Não posso mais ficar parado, não posso mais dormir hoje... Essa noite acabou, não importa se eu estava num bar e dormi pouco. Eu tenho que sair daqui e fazer o que for necessário, o que for satisfatório - mais do que o suficiente. Eu sei muito bem disso, eu não posso mais falhar... E tenho muito o que fazer.

domingo, fevereiro 20, 2005

Lá do fundo da sala de aula, onde eu me sentava pela manhã, começava a organizar a noite: passava um papelzinho pra lá, cutucava um ali e estava arranjado. Não é verdade, mas já disseram por aí que era só por isso que eu ia pro colégio dia de sexta-feira, para combinar o encontro no bar, à noite. De vez em quando aparecia mais gente, mas o time base nunca mudava, eu e alguns dos meus amigos mais chegados. Começou com o Titanic, mas o serviço ficou ruim e a bebida cara, então mudamos para o bar que nós mesmos apelidamos de Olivas, porque oferecia um prato de azeitonas assim que sentávamos à mesa - e foi assim que passei a apreciar azeitonas.

Se repetiu muitas vezes, o nosso encontro. É uma coisa dos tempos de colégio, terminados no fim do ano passado, de que vou sentir muita falta. Eu sei que voltarei a dividir uma mesa de bar com as mesmas pessoas algum dia, até mais que uma vez, mas nunca mais será a mesma coisa. Alguma sensação gostosa que passava sutilmente por todos nós, uma coisa etérea, não sei explicar, alguma coisa se foi. Sentar numa mesa de bar não será tão bom, não será igual, nunca mais.

Eu já tinha ido dormir e acordei pensando nisso, sentindo essa nostalgia misturada com a vontade de escrever que dá nas mãos. É noite de domingo, amanhã vou acordar cedo e cuidar da vida, começará mais uma semana. A melhor coisa que tenho são os meus amigos, é com eles que crio minhas melhores recordações, isso é viver.

quinta-feira, fevereiro 10, 2005

Meu cabelo cresce. Eu nunca tinha pensado, perguntado, ouvido falar ou lido sobre isso, então me ocorreu duvidar se eles crescem apartir das pontas ou das raízes. Numa fração de segundo menor que o átimo, me veio e me fui à resposta através de vários raciocínios. Imaginei os primeiros capilólogos realizando experimentos, me lembrei de conversas antigas sobre cosméticos, shampoos, condicionadores, antifrizz... De fato, cresce o cabelo apartir da raiz.

Importância qualquer, isso aí acima não tem. Estou em Brasília, deitava-me na rede (há aqui uma rede, pois estou em apartamento de baianos, como eu) e pensava em inúmeras coisas. Tentava advinhar algum final para o livro que estou lendo, outro romance português, calculava mentalmente quantas questões a mais teria que ter acertado para que o resultado do meu vestibular Unicamp tivesse sido positivo, ao contrario do que foi na verdade, pensava nesta cidade estranha em que estou.

Sim, Brasília é uma cidade estranha. Imagino, enquanto ando pelas ruas - sempre com o tráfego fluente - que esta cidade foi totalmente inventada. Não surgiu de maneira natural. Não veio aqui um homem, achou que seria um bom lugar para viver e montou uma casinha, não vieram depois outras famílias e montaram outras casinhas, não veio depois um comerciante explorar o novo nicho. Veio um político excêntrico, resolveu que aqui seria a capital do Brasil e construiu tudo de uma vez.

Meu cabelo cresce apartir da raiz. Brasília é uma peruca.

sexta-feira, janeiro 28, 2005

Fui ver a beleza e harmonia implantadas, artifiais, mas que, porém, me agradam os olhos que não sabem de nada disso, das praças do centro da cidade, encontrar uns meus amigos e sentar para falar qualquer coisa interessante ou divertida, descer a ladeira para ver o mar, com sua paciência inebriante, que me fascina, e não falar nada por um tempo. O barulho das ondas é sincronia pura, é perfeito, é quase um silêncio.

Fui ver essas coisas, mas vi crescer, agigantar-se e avolumar-se diante dos meus olhos a feiúra medonha e nauseabunda dos palanques do carnaval. Arquibancadas, camarotes, vigas de ferro, tapume, grades e toda a separação, todo o apartheid que isso, e que o carnaval, representa. E de cada lado da rua uma marcação, para o turista não se perder, centrais de informação com ar-condicionado e tudo sendo pintado com cores vivas e muito mau gosto.

Mesmo assim eu consegui ter uma noite ótima e cheia de beleza, de fluência, de sincronidade. Vimos o nascer do sol, mesmo sem ver o sol nascer, estávamos do outro lado do céu. Lindas tonalidades de azul surgindo e se modificando conforme os minutos passavam. Acho que foi a noite mais rápida da minha vida. Quando tudo flui, o tempo perde a marcação e a gente nem sabe mais a diferença exata entre dois passados.

E o mar desdenha de tudo, continua seu movimento indiferente às nuances de minha emoção. O mar que já viu tantos carnavais.

sexta-feira, janeiro 14, 2005

Os dedos batem com certeza no teclado. São os dedos que têm certeza, não é a mente. A mente não tem mais certeza de nada. A solidão em que me encontro, solidão de amigos, não de família - os amigos, não vejo desde o dia primeiro, quase nenhum, a família tenho visto sempre - a solidão em que me encontro e o livro que terminei hoje de ler, um capítulo, um copo d'água, um capítulo, outro copo d'água, outro capítulo, uma ida ao banheiro e outro copo d'água, o último capítulo, me fazem beirar algum tipo de loucura.

Ando lendo os números trocados. Li duas vezes o parágrafo onde havia "vinte e sete meses comendo a mesma merda" e li "vinte e seis". Duas vezes. Os números trocados ocorreram em número maior de oportunidades, no relógio. As confusões faziam parecer que o tempo estava andando pra trás. Quando comecei esse capítulo eram 2:20, agora, que começo este, são 2:14... Confusões assim. Será a loucura?

E eu, sozinho, no balcão do bar do Instituto Goethe, porque chovia muito e eu não podia ir pra casa naquelas condições, comendo chucrute, tomando a cerveja que esquentava na garrafa, pois eu não podia bebê-la toda enquanto ainda estava gelada, por uma questão física, eu pensava em várias coisas, olhava os anúncios, ouvia trechos de conversas das pessoas, olhava para a vela cheirosa - porque o bar tinha estilo e velas cheirosas, e eu jantava chucrute à luz de velas, sozinho.

Mas os dedos não erram, e quando erram, reconhecem e corrigem sozinhos, sem o auxílio dos olhos.

terça-feira, janeiro 11, 2005

É inevitável estar o tempo todo pensando em frases, às vezes versos. Assumi que escrevo, é uma das coisas que faço, apesar de não me considerar ainda um escritor e nem que eu escreva tão bem quanto já ouvi em elogios aos quais nunca sei reagir direito. Penso, apenas, o tempo todo, em frases bonitas, bem estruturadas e com ambigüidades propositais, histórias alegóricas, imagem de um dia perfeito em pote de margarina, comparações entre palhaços e poetas.

Então eu estava deitado na rede, olhando o mar e pensando em algo a dizer sobre a linha do horizonte, porque eu conseguia vê-la quase inteira, eu estava numa ilha sem grandes construções humanas, mas de grande requinte na arquitetura natural. Eu voltaria para a cidade do Salvador naquela mesma tarde, balançava-me preguiçoso e já um pouco nostálgico quando meu pai me chamou, insistiu e me convenceu a dar um último mergulho.

Lá eu só andava descalço. No caminho para a práia, furei o dedão do pé esquerdo numa farpa de madeira, poucos passos depois, uma pedra tirou uma fatia da sola do mesmo pé, com algum sangue de quebra. Ainda não acabou: pertinho da práia, tropecei (com o pé esquerdo, lógico), não caí porque me apoiei com o braço, acabando por ferí-lo um pouco.

Com todas as avarias, entrei no mar. O sal da água me fez arder as feridas, o impulso do reflexo nervoso era de voltar para a areia, mas felizmente a consciência foi mais forte e pude resistir. Não me arrependo de nada.

sábado, janeiro 08, 2005

Ainda não botei nenhum de meus velhos CDs nem abri o winamp para ouvir Mp3. Já não tenho a necessidade viciosa de estar ouvindo música o tempo todo, o silêncio é bom. Alguns costumes mudaram. Eu, hoje, acordei cedo, terminei de ler meu livro... Se aprende algumas coisas passando 6 dias a menos de 100 metros do mar, com uma práia quase deserta à sua disposição.

Em Morro de São Paulo, se vê o céu inteiro. Toda a circunferência do horizonte. Os olhos se reacostumam às cores. Azul, verde, areia... Tudo é muito intenso. As pessoas parecem ter sido tiradas de um livro, todos têm alguma história pra contar. Tudo é fotografável, todas as visões são bonitas, mesmo que estejam desgastadas. Há cavalos a galope pela práia, todo o transporte é feito por tratores o gipes, numa única rua que passa por dentro da ilha. É perfeito.

A volta pra casa foi um pouco chocante. De repente, os tons cinza e pastel da cidade. Prédios, carros, asfalto, barulho, muito barulho, televisão, buzina...

Vestibular amanhã.

domingo, janeiro 02, 2005

Ocean Trip

Estou indo pra Morro de São Paulo, que na verdade fica aqui na Bahia mesmo (apesar de ser infestado de paulistas... E de argentinos).

I'll be back in about a week.