quinta-feira, dezembro 30, 2004

Quando leio durante a tarde na varanda sempre sobe um cheirinho bom de comida. Algum vizinho de baixo cozinhando. Sei que vem de baixo porque cheiros dificilmente desceriam, são as leis da física. Na escola, eu aprendi as leis da física. Eu aprendi várias leis. Realmente tomei gosto pela leitura e pela minha varanda nesta reta final de vestibular, por necessidade, mas com prazer. Depois da hora em que o céu fica amarelo e a luminosidade não machuca mais meus olhos. Pois apartir de então, serei um leitor. É minha resolução de ano novo. Embora seja muito clichê a resolução de "ler mais"... Qualquer resolução de ano novo é clichê.

Não vou resolver nada só porque é o fim do ano. Não faz sentido. Vou ler mais apartir de hoje. 30 de Dezembro.

Nem vou lhes fazer uma retrospectiva dos principais fatos de minha vida pessoal em 2004. Vou falar do agora.

Eu tive um sonho hoje à tarde em que eu pulava do alto de um prédio para o prédio vizinho, numa altura maior. Meus amigos ficavam olhando lá de baixo e eu dizia que não tem volta. "Se eu tentar pular daqui, estarei morto. O que fiz foi suicídio." É isso que estou fazendo. Me morrendo, me nascendo outro. Impossível voltar para o ponto inicial, impossível continuar nesse prédio onde vocês, meus velhos amigos, estão. Me mudando. Todos os dias, o tempo todo: quais são minhas resoluções para este minuto novo?

Cada vez que vejo um colega de escola, penso que pode ser a última vez. Hoje foi a última vez que vesti a farda do colégio onde estudei por 13 anos. As coisas estão tendo um fim, estou indo para um outro patamar. Não... Não é um patamar, não é uma situação reta. Estou indo para uma situação totalmente diferente, uma onda, um risco, o topo de um prédio de onde eu não posso voltar.

Ninguém tira de mim a minha história. Nem o meu futuro.

segunda-feira, dezembro 20, 2004

Dogville...

Não costumo incomodar as pessoas quando estão lendo. Aprendi a respeitar este momento. Ninguém nunca me fez grosseria quando eu ainda não tinha noção disso, então acho que aprendi a não incomodar sendo incomodado. Não incomodo, mas se eu estou lendo e alguém me chama, procuro ter paciência. Pode não parecer, mas me tornei uma pessoa muito paciente. Entendo muito o lado dos outros, às vezes vendo inocência no que foi feito por maldade. Não julgo nem penalizo os outros com o mesmo rigor com que os faço a mim mesmo.

Assim, perco muito.

Lembro-me da reflexão que fiz sobre a minha mãe, sobre condescendência, sobre entender o lado dela. Meu pensamento mudou um pouco depois de certos episódios. Quando eu era mais egocêntrico, as coisas eram mais simples. Comecei a entender melhor a minha condição e a dela, passei a agir de maneira diferente. Houve alguns abusos de autoridade e de minha boa vontade.

Hoje ela chegou zangada, reclamando de tudo, perguntou, quase aos gritos, porque havia um refratário cheio de água no fogão. Não respondi. Disse que só responderia se ela me perguntasse com calma e tranquilidade, que eu não tinha nada a ver com os motivos daquela irritação. (Coisas que, aliás, eu digo pra mim mesmo quando estou aborrecido com terceiros).

A manifestação não foi bem aceita, mas a mudança se processa aos poucos.

Um menino no prédio do lado acaba de chutar a bola num matagal, os outros meninos caçoam. O dono da bola pensa se esta será recuperada.

Estou começando a entender melhor as coisas, de novo.

Ela bateu na porta do quarto agora e pediu desculpas, ainda com rispidez.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

Olho pela janela e passa um helicóptero. O céu está azul bem clarinho e o sol está naquela hora amarela bem bonita, quando tudo fica colorido. Daqui eu vejo, nos arredores do meu novo bairro, crianças brincando na piscina, umas mais velhas numa quadra de futebol, outras num campo, outras no chão de mármore branco, simplesmente correndo. Criança gosta de correr. Eu mesmo gostava, entrava em contato com o ar, interagia com ele e o suor só vinha depois da parada.

Passei a tarde inteira jogando fora alguns pensamentos que não me servem mais. Alguns pensamentos não me serviam mais. Agora, não existem mais. Deitado, sentado, em algumas posições inomináveis, sobre o meu novo colchão de um metro e dez de largura. Houve um instante em que cantei com tanta força, com tanta paixão, que me arrepiei. Já não cantava tão alto há muito tempo: tem coisas que só se consegue sozinho. Sozinho, eu consigo deixar a janela e a porta aberta para deixar todo o vento do mundo passar por aqui. Eu, então, respiro o vento do mundo todo.

Um bom livro me acompanhou e acho que termino-o ainda hoje. Ignoro a obrigação da leitura buscando nela algum prazer. Encontro fácil. Eu não sinto que fiquei em casa o dia todo sem fazer nada. Eu fiz muita coisa, eu estive em duas décadas diferentes, passeei pelo Rio de Janeiro enquanto ainda era uma cidade pacífica, vi o carnaval bonito e voltei para o meu século, bebi um copo d'água, estou em Dezembro. Uma das melhores tardes dos dois tempos.
A amizade é uma coisa deveras interessante...

Mesmo eu sendo esse sujeito estranho, de outra esfera, como disse a Madam, tem gente que gosta de mim, que se importa comigo e que faz coisas legais que eu não faria por elas. Não por maldade, mas por não fazer idéia do quanto essas coisas são legais. É que eu não sou daqui...

São legais. Eu fiquei contente, mesmo tendo sido acordado desumanamente às 8 da manhã.

Passei na primeira fase da Unicamp. A segunda, pode vir quente que eu estou fervendo.

domingo, dezembro 12, 2004

História...

Me perguntam às vezes porque eu guardo as partes desse prendedor de cabelo quebrado. Eu não respondo a verdade, sempre invento qualquer coisa ou desconverso, mas eu guardo para me lembrar... E eu me lembro bem.

Quando eu estava confiante para fazer todas as coisas certas... Estávamos sentados no terraço de uma pequena casa de shows, havia grupos de maconheiros, de conversadores, havia nós. Ele era meu amigo e não a conhecia, conhecia, porém, os meus anseios. Advinhou, sem querer, a data do aniversário dela e apartir daí a moça se encantou. Fiquei muito ciumento e perdi toda a confiança que tinha no caso, para não recuperá-la nunca mais.

Depois, não adiantava mais evitar porque ela perguntava por ele. O rio seguiu seu curso e não haveria de chegar noutro lugar que não o mar. Eu percebia tudo, porque tenho esse costume de ver por dentro das ações simples. Eu já estive nessa condição, eu sei como é. A gente faz as coisas com um único objetivo, depois fica tentando convencer aos outros e a si próprio de que foi por acaso ou por algum outro motivo besta, mas é porque a gente queria estar por perto mesmo, não há como negar.

Eu ficava tentando inventar coincidências entre nós dois, algo que superasse a advinhação do aniversário, era inútil.

O prendedor de cabelo quebrado, que eu guardo até hoje entre alguns ítens exóticos que colecionei nas terras por onde andei, serve para eu me lembrar. Eu errei. Eu sei que errei e errei por muito. Que eu devia ter, há muito tempo, dado o segundo e o terceiro passo, mas fiquei parado. Serve para eu me lembrar de nunca mais demorar tanto para falar algumas coisas, porque a vida está aí, as pessoas estão aí e elas se encontram.

Às vezes olham fotos da festa e dizem que a menina é muito bonita, perguntam se ela é minha namorada. Engulo seco e respondo que não, penso mudo que poderia ser, se eu tivesse sido mais corajoso.

Foi por um tempo, mas não é mais nada pessoal. Às vezes eu me lembro dessa história, mas é pensando muito mais em mim do que nela. Ela seguiu o curso do rio e chegou ao mar com meu amigo advinhador. Eu, hoje, procuro alguém com quem exercitar meu aprendizado.

quinta-feira, dezembro 02, 2004

Estou cansado. Mente cansada, corpo cansado. Já é Dezembro, uma piscadela e o ano acaba. O ano acaba, mas o esforço se extende um tanto mais: até o fim de janeiro estarei respondendo a provas de vestibular. A trajetória já dura 10 mêses e estou cansado.

Tenho uma vontade enorme de viajar. Esquecer a realidade por um tempo e me preocupar somente em me divertir. Dormir bem, acordar às 10 da manhã, ouvir pássaros cantarem e tomar banho de mar.

Em algum lugar, terei que encontrar energias para me empurrar até o limite. Estou numa batalha de nervos.

Depois, a resilência.

sábado, novembro 20, 2004

Não quero ir dormir agora, a varanda tem uma vista muito bonita. A noite aqui é muito mais escura, é urbano meio que sem ser.

Essa semana, acho que pela primeira vez, tive vontade de ir embora e me sustentar. Me ocorreu, enquanto eu bebia água, abrir mão de alguns privilégios para poder discutir algumas coisas. Atualmente, não me julgo no direito de discutir nada, só de aceitar e quando não aceito, me sinto errado. Me sinto olhando os dentes dos cavalos dados.

Eu sei que ela ainda faz muito mais por mim que eu por ela, que eu por muito tempo fui egoísta e egocêntrico, mas hoje em dia tenho na consciência que tenho sido um filho melhor. Não é só no campo prático, não só nas ações visíveis, não é só quando eu instalo a antena da TV para ela ver novela, toda vez que dá defeito. É nas coisas pequenas (ou muito maiores). Não sei se ela nota - só fui entender a grandeza de certas atitudes de meus pais muitos anos depois, de algumas ainda não entendo. Não sou daqueles que ficam anunciando as bondades que fazem.

É tempo de muito trabalho para ela. O dia inteiro e ela chega exausta, às vezes estressada e eu procuro entender. Por outro lado, vejo que a vida da minha mãe está melhorando. Vejo-a com mais amigos, saindo, se divertindo... Isso me tranquiliza, pois em breve vou tomar minha estrada e quero ir sem ressentimentos, medo ou culpa.

Agora já posso me deitar.
(Isso foi preciso)

segunda-feira, novembro 15, 2004

Eu tento ser o mais sincero possível comigo mesmo e com os outros ao meu redor, tento ser transparente, reconhecer meus defeitos, deixar que as pessoas me vejam como sou, mas é difícil. Minha maior luta é contra a minha própria hipocrisia. Todos os dias eu tento me entender e é um esforço imenso, acreditem. De algumas coisas, eu tenho vergonha, algumas coisas eu não quero revelar. Este blog é uma tentativa muito ousada - e arriscada.

Eu sinto muita inveja. Eu costumo lidar bem com a solidão, mas às vezes ela me angustia. Eu sinto minha inoperância. A tristeza toda parece ser minha culpa, não consigo botar a culpa nas circunstâncias, não consigo dizer que ela não me merecia, é estupidez. Meus amigos estão muito bem e eu detesto incomodar a felicidade dos outros com meus problemas. E ela é muito bonita mesmo...

Acho que alguém vai se incomodar, mas é que transparência incomoda mesmo. Talvez seja por isso que as pessoas se mascaram tanto. Uma sociedade totalmente verdadeira seria impossível, porque tudo é tão egoísta, tão mentiroso, tão hipócrita... Me conhecendo e me admitindo, acabo vendo o mundo com maus olhos. Ainda assim eu busco a felicidade e acho que ela é possível.

Acordei pensando nisso...

quinta-feira, novembro 11, 2004

Está acabando o ensino médio para mim. Eu olho ao meu redor, vejo muitas pessoas com quem me acostumei a conviver, que fizeram parte de minha vida, que me fizeram rir e me aborrecer. Tenho consciência de que muitos deles não verei nunca mais, nunca mais vou ouvir a voz, o riso, os passos... Esta constatação me deixa muito aliviado, para ser sincero. Algumas pessoas ficam simplesmente no meu passado, eu admito: escondo gente embaixo do tapete.

De algumas, bem poucas, pessoas eu gosto de verdade e gostaria de manter meus laços, vou me esforçar para isso porque elas me proporcionam bons momentos, mas se eu não conseguir, será que vou sentir saudades? Acho que não. Isso me dá medo. Já passei muito tempo longe de pessoas queridas sem sentir saudades. No ano passado, um de meus mais velhos amigos foi para o Sul do País, de onde só retornou no inico deste ano. Me emocionei na despedida, mas depois que ele foi, saudade não houve.

Não sei o que acontece.

Mas às vezes, de repente, me dá vontade de falar com meu pai e aí, só para trazê-lo mais para perto, cantarolo uma das músicas que ele gosta de tocar no violão...

Tenho a impressão de que vou viver só por algum tempo, não é muito fácil que eu me ligue a seres humanos. Da maioria eu quero é distância.

domingo, outubro 24, 2004

Carta...

Imagino agora que eu poderia estar te tocando, que eu poderia ter te beijado ontem à noite, que muitas coisas já poderiam ter acontecido em minha vida, não só ontem, não só você. Da última vez que aconteceu eu prometi que não ia mais, nunca mais, me calar diante de uma oportunidade. Me sentei ao seu lado no banco do ponto de ônibus, você, sozinha, ia pro mesmo lugar que eu - eu sabia com certeza, porque às vezes as coisas são sabidas assim, sem nenhuma pista. - E me calei.

Estando lá, te vi de novo por mais umas duas ou três vezes, duas ou três vezes me calei. Não enxerguei o que podia acontecer, não enxerguei o tamanho da oportunidade diante de mim, não enxerguei que estava ali o que eu queria, o que eu desejei. Eu sonhei com isso e na hora que aconteceu, aconteceu de eu me esquecer do sonho, de eu fechar os olhos e continuar andando só.

Eu ainda não aprendi, mesmo depois do que já passei, que as coisas podem acontecer - é só a gente fazer, como já fiz antes. - Ainda não aprendi que não depende de tantas coisas assim, que não ser conhecido seu até então não era problema nenhum, porque as pessoas se conhecem mesmo é na vida e a vida está acontecendo.

Se eu te vir de novo, prometo não me calar.

quinta-feira, outubro 21, 2004

Acordo bem cedo, porque agora estou distante do colégio, faço um trajeto de uns 40 minutos de ônibus. Quando passo pelo portão do prédio, encontro o porteiro que passou a noite inteira em serviço cantando uma daquelas canções antigas - e canta muito bem. Bom dia! E ele responde com alegria e fineza. O sol da manhã no rosto é gostoso, não queima, aquece, dá energias para carregar a mochila. A volta pra casa, com o sol do meio do dia é mais cansativa, mas é compensador chegar à mesa posta ao final dele.

De tardinha, lendo na varanda. Existe uma imensidão de árvores diante de mim, é uma linda paisagem. De tardinha, elas ainda se mostram verdes, bem vistosas. Ainda há o verde na luz, nas folhas, nos meus olhos e eu entendo o que a ciência explica para este fenômeno. O céu ainda é azul, mas vai perdendo a cor gradualmente. Ele passa, durante alguns minutos, por um amarelo bem da cor do sol e este amarelo bate nos prédios, no parque, na rua, nas costas das pessoas, na minha varanda, no meu livro e é a hora mais bonita do dia. O ar fica frio, a luz vira sombra, o céu fica vermelho e também é muito bonito. Li mais um parágrafo e escureceu. Luz artificial, mas só aqui dentro de casa - não chega nas árvores. Fica tudo umbral, não se sabe do que é feito, até onde vai e então tudo parece imenso.

É noite e o silêncio é impressionante. Estou numa metrópole, mas a proximidade do Parque Da Cidade trás a tranquilidade de uma fazenda. Estou no décimo primeiro andar e ouço grilos. Não há muito barulho de carros, não há caixas de som tocando pagode. Só existe a música que eu quiser ouvir, se eu quiser ouvir. Estou adorando morar aqui.

sábado, outubro 16, 2004

Tudo é novo. O vento, enquanto durmo, vem de outra direção. As distâncias são outras, as gavetas são outras, outro lugar para deixar o tênis e pegar a sandália... Ontem me bati na saboneteira enquanto tomava banho, conheci meu inimigo... Outro caminho para ir pro colégio - este que só terei que fazer por mais um mês na vida. Me mudei de apartamento e de bairro. É um lugar distante de onde eu costumava viver, mas é bom explorar novos ares, conhecer pessoas novas, possibilidades novas.

Estive ocupado com isso... Conto mais depois.

sábado, outubro 09, 2004

Porque as mariposas gostam tanto da luz? Não lhes machuca as vistas? Quando eu olho demais para ela, fica uma mancha nos meus olhos. Verde, azul, e no final se vê o vermelho... Depois a mancha some e volto a enxergar o mundo no mesmo preto e branco. O asfalto, os prédios não têm muito colorido. O mundo é um pouco chato e para o entretenimento, precisamos imaginar algumas coisas. Se apago a luz, vão-se embora as mariposas. Prefiro a escuridão.

A música fica bem no meio da cabeça e de lá chega os ouvidos, às vezes à boca. É incrível o que se consegue pensar andando sozinho na noite, cruzando com outras criaturas notívagas, com um pouquinho de medo de alguma delas lhe fazer mal, mas no fundo, acreditando que vai chegar em casa. Em casa, onde eu... Moro. Onde eu durmo, onde eu fico só, onde eu guardo meu violão, água.

O mundo tenta me convencer de que se eu estou sozinho hoje, se estou em silêncio, se não estou na Fashion Club me divertindo a valer, se estou em casa numa noite de sábado e se não tenho ninguém para fazer sexo, é porque sou incompetente. O mundo tenta, mas não consegue. As idealizações de vida nos outdoors de condomínios fechados não me seduzem. Eu sou maior que isso. Eu prefiro a escuridão.
Hoje amanheceu escuro...

Recobrei a consciência depois do desmaio, ouvia vozes, mas não identificava frases ou melodias. Abri os olhos e senti falta de pinturas, de cores, de vermelho, o cheiro era de chulé. Era o chão, onde as pessoas pisam.

Não gostava de lá. Era medíocre, uma prisão e eu estava algemado pelo conformismo, não tinha sede, fome, desejo. Era o vácuo entre o fim de uma historia e começo de outra. Uma página em branco entre dois capítulos. As personagens descansavam, minhas pernas estavam dormentes e eu desmaiado.

Acabou. Agora acabou de uma vez. O passado se encontra no passado, está tatuado na minha biografia, ninguém tira de mim, ninguém acrescenta nada. Hoje, daqui a um segundo, começa o futuro. Eu quero, eu sou, eu sei.

Já passou um segundo, já começou... Porque eu decidi.

terça-feira, setembro 28, 2004

Eu me enganei. Menti para mim mesmo e acreditei, caí no conto de minha própria encenação e a peça era uma farsa, uma trajédia... Já descobri minha verdade: achei que minha recuperação tivesse sido rápida, mas amores não se vão assim tão depressa.

Ainda me lembro de como eu ficava contente quando ela aparecia só para conversar besteiras. Eu ficava só olhando, contemplando e achando bonitinho, começando a querer, a acreditar que era possível dessa vez... Porque não? Então "vamos ao show, cara, vou te mostrar a menina de que te falei." Me sinto como se tivesse sido auto-sabotado. Eles se gostaram no instante em que se conheceram e já estava para acontecer o que tinha que acontecer. Aconteceu.

Por alguns dias achei que estava bem, mas os fatos às vezes batem minha cara de novo, vêm com violência me derrubam. É difícil até me concentrar em outras coisas. O chão, onde as pessoas pisam, é frio, sujo, asqueroso... Quero logo me levantar, mas parece ser mais que uma simples decisão.

quinta-feira, setembro 23, 2004

As palavras são meras convenções
Com suas formas, prosódias e significados
Tudo inventado pelos homens grandes...

E a gente desaprende como se comunicar
Pelo olhar, pelo toque, pelo sorriso, pelo silêncio
Ficamos à mercê destes intermediários - as palavras

E os intermediários, nós sabemos
Nunca passam a mensagem que queremos

segunda-feira, setembro 20, 2004

Tenho minha honra intacta. Fui honesto, fui verdadeiro. Tive coragem de fazer o que muito homem feito não faz até hoje. Fiquei nervoso, tremi, mas fiz, falei. Ela me ouviu demonstrando muita bondade, respondeu que era complicado. Ficou entendido que não ia acontecer nada entre nós, mas ninguém pode questionar que eu tentei. Foi uma vitória sobre um monstro que me atormentava já há muito tempo.

O que acontece com gente como eu é ser atacado pela desonra dos outros.

Alcancei minha vida num pulo, ela está ferida, ainda sangra. Acho que a recuperação será lenta, mas destes assuntos, ninguém pode prever nada. De qualquer forma, vou precisar de um tempo no fundo do mar... de novo.

quinta-feira, setembro 16, 2004

Fugiu ao meu controle. Escrever às vezes é assim: vai embolando e de repente surgem o lirismo e a fluência. Dessa vez, tudo fugiu. Eu abri as mãos e deixei minha vida cair. Tenho medo, paranóia. Onde ela está? Nas mãos de algum traidor? Estão lhe fazendo mal. Vou mergulhar e tentar pegá-la de volta. Como em qualquer mergulho, talvez eu afunde.

O fundo do oceano, lá está de novo. Eu, cá estou de novo.

segunda-feira, setembro 13, 2004

A gente sempre despreza os problemas alheios, acha fácil de resolver, simples, prático. Tudo se resolve colocando as cartas na mesa, tudo se resolve com o nosso magnífico bom senso de uma forma justa para todos os envolvidos...

Eu queria que meu problema fosse o vestibular por que muitos de vocês se esgoelam, se estressam e dedicam suas vidas. Queria ter sido difamado injustamente, ter ferido o dedão do pé num jogo de futebol, que o meu time fosse para a segunda divisão. Queria que minha vida social fosse ruim, que meus finais de semana fossem um saco, que meus amigos não tocassem numa banda legal, que eu mesmo não tivesse banda nenhuma.

Preferia ter brigado com meus pais, que eles me fizessem pressão psicológica sobre o meu futuro. Preferia ser ruim em matemática, física e química, que minhas notas estivessem vermelhas. Que meu computador quebrasse e eu perdesse os arquivos, que ninguém lesse este blog, que eu não soubesse mexer no photoshop...

Mas meu problema é outro. "E eu corri pro violão num lamento, a manhã nasceu azul. Como é bom poder tocar um instrumento."

quarta-feira, setembro 08, 2004

Só tenho alguns minutos, já perdi tempo demais com besteiras. Talvez não tenha mais tempo nenhum. Quando penso no que já pode ter acontecido, tenho falta de ar. Meu peito dói. Meus vacilos vêm à tona e se esfregam no meu rosto, me humilham. Aceito, abaixo a cabeça, admito e é só o que consigo fazer, por enquanto.

É que, infelizmente, a noite já acabou. Tenho que anotar meus sonhos para tentar me entender e traçar melhor meus planos. Água fria no rosto e eu acordo. Não parece justo, mas no mundo muitas coisas não são justas. Estão por aí pessoas que querem te dar um soco no olho assim que te encontrarem.

Ao menos existe o sol para me guiar durante o dia, a lua para me guiar durante a noite, a música para me acompanhar sempre. Ao menos, consegui enontrar alguma beleza e enxerguei como é feio o resto da cidade. Ao menos, tenho o que admirar e um motivo para ter esperanças quando me sinto sufocado.

Céu azul, é hora de ir.

terça-feira, agosto 31, 2004

Hoje, só grunidos sem sentido. Quero achar a ponta do fio e puxar, mas só encontro os nós, os emaranhados. Gostaria de entender, gostaria de ter um bom conselho desta vez. Normalmente eu consigo me aconselhar sozinho e chego a uma boa solução, desta vez, só grunidos. Passei uns trinta minutos exercitando melodias sem palavras, porque não consegui as palavras.

Só consigo me arrepender de ter perdido as chances que perdi - e sabia que me arrependeria. Causa e consequência. Agora estou doente de vários jeitos, com febre de vários jeitos. A febre é uma reação. A febre cura. Estou sentindo todo o calor, sentindo o sangue circular em busca das impurezas, dos organismos invasores, dos vírus, vícios e cânceres.

Depois da febre, vem o suor e a redenção. E o guerreiro se levanta para desbravar novas fronteiras. Por enquanto, só grunidos.

quinta-feira, agosto 26, 2004

Seremos perfeitamente civilizados
Sem intimidades ou ousadias
Nada de cantar alto à noite
E entre nós, mais nenhuma poesia

Uma fórmula para o sumiço
Como se não tivesse sido
Nenhum passeio pela lua
Nenhum sussurro no ouvido

A garrafa lacrada e seca
Como a minha boca
O nó trancado e cego
Como os meus olhos

Não mordo, não falo, não beijo
Não choro, não pisco, não vejo
Tenho muita sede, mas não bebo
Tenho um grito, mas silencio

Seremos cúmplices do absurdo
E não nos veremos mais

terça-feira, agosto 24, 2004

Sobre a segunda-feira, esse dia não nasceu para ser vivido. Eu gostaria de não ter acordado.

Só mesmo alguém que não vê só pedras nas pedras para ter feito-me sorrir.

segunda-feira, agosto 16, 2004

"Catalisadores aumentam a velocidade das reações químicas e se mantém inalterados durante o processo". Certo, entendi. Preciso de um desses: sou um átomo no estado natural e estou querendo reagir. Aulas de química só servem para encontrar metáforas ridículas como essa e como o meu professor. A poesia, a poesia eu prefiro.

Está tudo muito rápido e eu ainda não fiz as minhas decisões. Minha cabeça rodopia sobre a mesa, pende ora para um lado, ora para o outro e não para de girar, eu fico tonto. Meus ciclos de criatividade se completam mais uma vez e eu torno a me imaginar artista do som, da imagem ou da palavra. Eu vejo as coisas com outras cores e consigo dialogar com muito poucos.

Dois minutos depois, a minha compreensão ampla das linhas retas, ligações atômicas, peptídicas e sinais elétricos nos neurônios me deixa fascinado pelas ciências. É um fascínio que pode me ajudar na batalha que o mundo é. São chances maiores. O peão gira, gira e eu olho para todos os lados.

Enfim, não sei para onde aponta a flecha. Sei apenas que tenho toda condição de acertar os alvos.

segunda-feira, agosto 09, 2004

Há sempre o caminho mais fácil, todo ladrilhado, arrumadinho e com um lago no final. Eu comecei a andar por ele, mas não tem graça. Gosto mesmo é de me arranhar nos espinhos do outro, mesmo que sangre, que doa. Eu gosto de cicatrizes de batalha. Quero o que for capaz de me derrubar num só golpe, para eu ter certeza de que precisarei de todo esforço a cada esquiva e a cada próximo passo, porque no chão tem lama e areia movediça que pode prender meus pés e me afogar.

Quero assim mesmo, porque no final deste segundo caminho, está a vida que eu quero.

Não estou falando de trilhas ecológicas, nem de vestibular, nem de profissões, nem de cidades. Estou falando de amores.

segunda-feira, agosto 02, 2004

Era linda, um anjo. Todas as feições bem feitas, esculpidas por um artista grego, a menina era uma arte só por existir. Segurava o copo de suco de laranja com leveza, não com a elegância fabricada da etiqueta, uma leveza natural como a das fadas dos mitos antigos. Estava entre o pai e o irmão, de frente para a mãe. O pai era um cinquentão austero, daqueles bem seguros de si e para mim, tinha ares de corrupto. O irmão tinha algum retardo mental, percebi logo por causa do cabelo raspado. Cabelo grande não é prático, se não for bem limpinho pode dar coceira. É mais fácil raspar, retardados mentais não ligam para a aparência. A mãe era muito chique, muito artificial, cheia de joias e laquê na cabeça.

A menina parecia entediada. Olhava para o vazio em todas as direções. Torci para nossos olhos se encontrarem, nos entenderíamos à distância e em silêncio, mas ela não aparentava prestar atenção às outras mesas da pizzaria, continuei minha contemplação anônimo e ignorado, mas satisfeito. Era como ler uma poesia numa página de livro velho: o poeta não sabe quem vai ler, nunca vai saber quantas emoções realmente provocou com aqueles versos, mas escreve. Ela escrevia com seus gestos.

De repente, deu um abraço e um beijo muito afetuosos no pai, se mostraram muito ligados e isso fez, imediatamente, desaparecerem os seus ares de corrupto. Era agora um pai trabalhador, muito estudado, esforçado, honesto e que ensinava princípios aos filhos. Da mãe e do irmão continuei pensando a mesma coisa, pois ela não se manifestara em relação a eles.

Sorriu só uma vez, quando conversou com alguém no celular do pai. Não sei quem era nem ouso supor. Meu jantar na pizzaria foi muito bom.

quinta-feira, julho 29, 2004

Bem que a madam disse, meninas são idiotas antes dos 30. São mesmo. Ela soltou minha mão porque estavam fazendo gracinhas na sala. Eu precisei de um tempo para engolir, processar e entender. O que faz a opinião das pessoas ser tão importante só por elas estarem ao redor? E não eram nem opiniões sérias...

Eu ainda espero que as pessoas que eu admiro pensem um pouquinho como eu, que tenham pensamento independente e saibam desprezar o que não merece atenção, se divertir, falar sério, ficar em silêncio... Ainda fico catatônico com as feições bonitas e seus movimentos sempre graciosos, ainda fico esperando que saia algum som genial ao abrir dos lábios. Espero que sejam livres, mas acabo me decepcionando.

Às vezes me contento em ficar olhando de longe, vendo a poesia nos cabelos, nos olhos, no sorriso e até na lágrima. Me alegra. Quando as ouço falar, normalmente se destrói. Às vezes não, então, mais um sopro.

segunda-feira, julho 26, 2004

Meu aniversário será um dia comum. Vou acordar, olhar pro céu esperando que esteja azul, tentar advinhar se estará chovendo dentro de 30 minutos, me expreguiçar, amaldiçoar o despertador e levantar. Dou algumas voltas pelo quarto pensando se vale a pena. Vale. Me jogo no chuveiro frio, é um choque e tanto. A água nunca esteve tão gelada quanto está agora. Salvador nunca esteve tão fria em toda a minha vida.

Toda a minha vida completará 18 anos. Os homens convencionaram em suas leis que uma pessoa que já viveu 18 anos está preparada. É o fim do treinamento, agora já está preparada para as dores do mundo, o estatuto da criança e do adolescente não te protege mais, você vai carregar pedra para se sustentar, é um adulto responsável por seus atos. Homens estúpidos.

Depois de toda essa filosofia, eu chego no colégio. Vou receber os parabéns de muita gente para quem eu não estou nem aí, algumas pessoas para quem eu ligo não vão nem falar nada. Eu não me importo com convenções, não sei nem se vou festejar oficialmente. Contanto que eu não perca meus costumes sabáticos e dominicais e que a vida continue valendo, vou aniversariar por muitos anos.

sexta-feira, julho 16, 2004

Estou em Juazeiro e mais uma vez, não há ninguém na cidade. É noite. Juazeiro é muito bonita, parece uma cidade da antiguidade. Tem uma arquitetura peculiar: uma mistura da arte celta com a maia ou inca. As formas são bem definidas e azuis e há esculturas e decorações douradas sobre elas. Eu penso: "Juazeiro não é tão acabada quanto disseram, imaino como deve ser Petrolina..."
 
Passo pelo portão da cidade.
Foi um sonho. O terceiro de uma série de sonhos em que me encontro sozinho. O primeiro foi na Grécia antiga, também vazia, o terceiro se passou numa estalagem abandonada: eu estava sendo perseguido e me escondi lá até a poeira baixar. Não havia ninguém. O que são esses sonhos?
Solidão?

Sensação de estar explorando um terreno onde não há ninguém? De ter que seguir meu caminho sozinho?

De que já estou só em meus pensamentos, dúvidas, desejos...?

segunda-feira, julho 12, 2004

As sombras passam rápido pelos meus olhos, eu acompanho quieto, calmo, silêncio total. Eles nem fazem idéia de que eu estou aqui a espreitar... É uma grande selva e eu sou um predador rápido e feroz. Escolhendo cuidadosamente o alce que sofrerá o ataque fatal na jugular e do qual me alimentarei durante o inverno.

É difícil, no calor do momento, com toda a pressão do apetite, da barriga vazia... Há vários fatores decisivos, mas vou pelo melhor sabor da carne. Algumas sensações são incomparáveis. Me dão forças para caçar mais e melhor do que se eu tiver um bizão gordo e lerdo onde me refastelar o ano inteiro.

Cheogua hora de afiar as garras para o golpe final do embate. Não vou falhar. Sou um predador rápido, feroz: implacável.

terça-feira, julho 06, 2004

Não havia nada que pudéssemos fazer, ele ainda está lá caído no chão os braços abertos, olhando para o céu. Nada ao redor faz sentido, só ele e o sol. Um grito angustiado, um pedido de energia para a longa caminhada, para longe desses muros.

Aconteceu tudo muito rápido, não deu tempo. Um fim de semana, um par de segundos. Eu queria ficar mais na práia, mas não pude: as obrigações não deixam. Eu não teria como sustentar.

Agora venho envelhecer de segunda a sexta-feira, carregando pedras para construir a minha lápide, voltando para buscar mais. Caio no chão com os braços abertos e peço ao sol um pouco mais de sua generosidade.

Não há nada que vocês possam fazer.

terça-feira, junho 29, 2004

Tarde... Cães sem dono, mais livres. pobres e famintos que eu nas ruas. Escuro, mas há os postes, uma longa ladeira que eu tenho que descer. Vem alguém subindo e tenho tanto medo dele quanto ele de mim, mas somos, os dois, pessoas honestas: seguimos nosso rumo em paz e até nos cumprimentamos quando atingimos o mesmo ponto da ladeira, eu descendo e ele subindo. Eu ainda tinha que atravessar o esgoto para chegar em casa.

A noite é interessante só por ser escura, ainda mais quando encontramos certos tipos exóticos. Eu ainda quero pão, sim. Certos tipos exóticos dividindo conosco uma mesa de bar e querendo mais cerveja. Mais garrafas e tulipas cheias (não por muito tempo). Gente nova por aí discutindo o dinheiro e a filosofia num dos botecos liberais: cerveja para menores, gays, lésbicas, simpatizantes, eu e uns amigos que não temos nada a ver com nada disso nem contra nada disso. Umas amigas que tem tudo a ver com tudo isso e tudo mais.

Sensacional.... A noite cresce, mas eu já cheguei em casa, seguro, depois de atravessar o esgoto e conseguir passar limpo.

sexta-feira, junho 18, 2004

Cheguei e vi que estava só. Um belo lugar, o sol, como eu disse, estava lá exposto, nada de tempo ruim, como eu havia dito três dias atrás... e eu só. Vaguei pelas ruelas de pedra, pensei em sentar num dos bancos de madeira, mas não estavam convidativos. Outros grupos, bem longe de mim, falavam alto, experimentavam novas dosagens químicas de certas substâncias... tinham um mau-gosto musical. Eu com meu violão nas costas, não nos braços.

Por um segundo, pensei em desistir daquela história. Já estava demorando. Me bateu a sensação ruim de ter que abandonar o desafio da trilha e voltar para a mata fechada, tendo que caçar larvas. Para a selva do cotidiano, da falta de toque, de charme, de conquista... Para os braços levianos dos anônimos da festa, os olhos que não olham nos olhos enquanto falam, quanto menos enquanto cantam. O desespero de não estar vivendo história alguma.

Mas não foi preciso... Ela chegou.

quinta-feira, junho 17, 2004

sábado, junho 12, 2004

Vou crescendo e aprendendo a gostar das mesmas coisas que o meu pai. Caetano, Cazuza, Cerveja. A luz que vêm dos lares, das casas, dos apartamentos... A luz se mexe. As conversas dos outros parecem estúpidas, eu penso em coisas muito mais nobres, mais complexas, mais compensadoras. Só eu cresço e conheço a dimensão do mar, a distância entre o céu e a terra, entre os belos e os feios, os sábios e os opacos. As outras mesas do bar não são tão boas quanto a minha. Meus amigos compartilham ou não da mesma visão. São melhores que os amigos dos outros.

A história de minha vida vai se escrevendo de domingo em domingo, a cada desnível etílico uma nova idéia, uma nova concepção. Um verso, uma frase, uma música. Aquilo que me faz respirar, cuidar de minhas mãos e de minha garganta: eu vivo porque posso ouvir e cantar. Ouço porque me dá prazer e faz valer a pena o tempo que passo em silêncio, nas vozes obtusas. Canto porque o som move oceanos, o som é uma ponte e não há ilha em total silêncio.

Eu vivo assim. Disso. Por isso. Não me diga que estou errado, que eu não vou ouvir. Muito pouco, ou pouco muito? Tudo.

terça-feira, junho 08, 2004

O mundo tem muita pressa. Relógios, hora marcada, data, compromisso. Chove de manhã e na avenida se faz um grande engarrafamento. Um minuto para a gota cair do céu até o guarda-chuva, o capô do carro parado já há uma hora. Que perda de tempo, atraso de vida, não se aguenta mais esperar.

Que tempo é esse do engarrafamento em que não se vive? Que gente é essa que morre atropelada por carros parados? A espera, a música do rádio e da queda da chuva, o céu, os passarinhos se protegendo e as pessoas passando apressadas: Tudo faz parte. E o tempo... Esse é muito complicado. horas e minutos, frações menores. Ponteiros, setas, vá por ali.

Eu queria não marcar o tempo. Só dias e noites, quando dá sono, quando dá fome, quando dá vontade... Na minha casa da montanha, eu vou conseguir.

segunda-feira, junho 07, 2004

Dia de Sol

Foi uma alegre fantasia
Que nós vestimos
Para ver o nascer do sol
Em nossa práia deserta

Foi o bronze na pele
Que tudo embelezou
E nos trouxe felicidade
Para sorrir e cantar

Quem te viu e te vê não diz
Que está tudo igual
E ainda somos os mesmos dos dias de segunda
Quando o sábado custava a chegar

A esteira de palha preguiçosa
Durava o dia inteiro
E aquela sensação de paz
Que chegava num ventinho bom

Foi o calor da terra
Que nos emocionou
E trouxe harmonia
Pra sentir e tocar

Que a gente sabia que o dia de sol
Não ia durar o ano todo
É o fim-de-tarde
E o amanhecer custa tanto a chegar

Foi só uma alegre fantasia
Que ontem desbotou
Quando o sol enfim se pôs
Entre os prédios da cidade

Não venha me dizer
Que a vida é feita de Ilusões, porque não é
Se fosse assim
a terra estaria morta e não está

Hoje você vive ouvindo
Ao que todo mundo diz
Vai dar a volta ao mundo
E nunca será feliz

quarta-feira, junho 02, 2004

Noite de ontem pra hoje, deitado na cama, olhos fechados, Rapid Eye Movement. Tróia há 3 mil anos e eu estou lá me preparando para enfrentar o exército dos mirmidões de Aquiles. Eles apavoram, nós tentamos nos distanciar para ter tempo de organizar o batalhão e distribuir o armamento antes que eles nos alcancem. Estou numa casa me armando e tenho um escudo de pano vermelho e branco. O tecido é suave e macio, quase uma seda, vejo que não me protegerá e que tenho que procurar outro.

Mas o inimigo bate na porta. Meus aliados seguram o máximo que podem, mas não conseguirão por muito tempo. São fortes, destemidos e valorosos guerreiros. Entraram. Luto eu contra Aquiles, o maior dos guerreiros, e consigo desferir-lhe um golpe fatal: minha espada atravessa a sua garganta. A expressão dele, porém, é de triunfo. Não compreendo o desprezo que ele mostra diante do próprio sangue. Não vejo ferimentos no meu corpo, só sinto uma pequena dor nas costas, mais nada. Meu corpo está intacto. Ele perdeu.

Não... Não encontrei o calcanhar de Aquiles antes do sonho acabar.

domingo, maio 30, 2004

Sentado na cama, como de costume. Eu começava a tocar Lucky. E voltava no tempo. Senti o cheiro do meu suor doente, me lembrei da impotência que sentia pela garganta estar avariada. Eu não conseguia cantar e me sentia triste. Senti o tempo lento de quem passa o dia inteiro em casa, abafado, de janelas fechadas. A sensação interessante de estar conhecendo alguém que, hoje eu sei, mudou minha vida e cuja vida eu mudei também passou pelo meu estômago. Desde então, foram 4 mêses curiosos. I feel my luck will change.

Minha vida tomou um rumo atípico quando, na apoteose de minha adolescência, minha mãe ganhou uma bolsa de estudos e foi fazer pós-doutorado em Artes em Paris. Eu estava então com 17 anos e uma autonomia incrível sobre as minhas noites. Eu posso sair sem dizer para onde nem quando volto. Posso não voltar, passar 3 dias fora, chegar sem dizer bom dia e dormir por 14 horas. Posso ficar sem comer, beber fermentados e destilados, cair no sofá... no chão. Não ir para a escola na segunda-feira.

Mas eu fui irresponsável apenas na medida certa. Cuidei bem dos estudos, das despesas da casa, da saúde, da sanidade e segurança. Minha mãe não tem do que reclamar. Ela chega amanhã.

terça-feira, maio 25, 2004

A Hand

O post de hoje está abaixo, mas antes...
Aí vai um recado:

Designer procura emprego

Procuro emprego de designer, diretor de arte, encarregado de arte, em gráfica, com web, cinema, tv.
Tenho 15 anos de experiência comprovada. Já trabalhei com revistas, agência de publicidade, cinema, tv.
Trabalho com web desde 1996, e já coordenei projetos grandes como portais e sites de leilões.
Tenho larga experiência em atender grandes clientes, dar atendimento comercial e suporte téncico.
Meu curriculum online: curriculum vitae
Por favor mandar email para Daniela Castilho.
Fluxo

Nada mais faz sentido depois desse porre paranóico. Vêm os homens atrás de você e seu corpo corre. Toda a força, mas eles são rápidos. Choveu mais cedo e o chão está escorregadio agora à noite. Seu passo afobado não resiste, a sola dos seus sapatos não segura, não te empurra do chão. É escuro, você não vê muito. Queda feia, mas não há tempo para o sangue cair e a dor se alastrar. Eles chegaram.

A neurose destilada começa a se desconcentrar, mas os olhos ainda não podem abrir. É até melhor assim. Só há desgraça e desordem na rua, do lado de fora. As pessoas sobem na condução com suas expressões, profissões, sacolas e problemas. Ninguém se olha, se ouve, se entende. Descem da condução e nunca mais voltam, nunca mais se vêem. E que vai obrigar? Ensinam isso na igreja. Onde está...

Um soco no estômago. Acorde. Está na hora. A cidade já amanhece e você deve ir. Resista às suas dores e aja como homem. Esqueça que um dia você viu nossos rostos e esteve aqui. Siga com sua vida e boa sorte.

segunda-feira, maio 17, 2004

Eu sei muito bem o que é e sei o nome. Quando os olhos se mexem pelo cômodo sabendo que ele está vazio, mas com esperânças sinceras de vê-la. Quando tenho certeza de que ela não vai aparecer na minha frente, mas fecho os olhos e conto até 10 e mais um pouco pra ver se ouço a voz. Quando o ritmo acelera com força e pegada. Bumbo, condução, tambor, virada e pratos. É a marcação da minha música que ela faz direitinho.

Mas o curso dos meus atos eu não sei qual é. Eu posso não fazer o menor sentido. Os olhos se mexem pelo cômodo circular e procura um canto para eu encostar a cabeça e me esconder. Só existe o canto da minha voz que ecoará pelo vento. Tomara que chegue lá. Preciso achar os ventos certos. Preciso soprar eu mesmo, estou inspirando todo o ar que posso. Temo que demore demais.

Eu sei muito bem o que é e sei o nome. Não posso, não devo, não quero deixar passar como se fosse uma exclamação qualquer.

terça-feira, maio 11, 2004

É um incêndio na escola. Funcionários correm assustados, professores mantêm a compostura e a maior parte dos alunos não esconde a animação e o interesse pelas causas do acontecimento. Estão sendo queimados cardernos, livros, cronogramas e avisos aos senhores pais. Cinzas. É o destino de tudo que vemos e compramos com os olhos da cara. As paredes, as grades, os muros...

... As portas. Nunca foram tantas. Nunca desaprendi e me desprendi de tantas tolices em tão pouco tempo. Nunca me senti tão livre e resolvido com meus conselhos, opções e escolhas. A dúvida continua aqui, mas para me mostrar que nenhuma certeza é absoluta, nenhum caminho é sem volta e nenhum poço é sem fundo. Já tive as águas do mundo sobre minha cabeça e consegui atravessá-la. Estou no alto da montanha.

Vejo daqui, sentado numa calçada de mármore, todo o fogo. Tudo aquilo vai cair deixando espaço para uma floresta crescer das flores mais delicadas às árvores mais imponentes da natureza. Verde. O único sinal à minha frente. Meu vôo livre está começando.

terça-feira, maio 04, 2004

Estávamos lá, nós dois. Eu me esforçava para ouví-la e responder com frases inteligentes e bem humoradas para ela rir. Eu gosto quando ela ri. Algumas vezes conseguia, mas na maior parte do tempo eu só conseguia me concentrar em seus olhos, na sua boca e pensava em beijá-la o tempo todo. Não teria sido conveniente. Acredito que não tão rápido.

Minha vida explodiu no céu. É um salto às aturas, finalmente e como eu havia anunciado. As coisas progrediram de uma maneira impressionante e muito está dando ceto. Eu sei onde procurar as coisas de que, agora, preciso. Meus perteences não caem mais no chão para que eu me agaixe e pegue. Muitas sensações alegres me percorrem.

Com os olhos salgados de quem esteve no fundo mar e enxergou onde a luz nunca bateu, eu vejo novidades. A noite, a lua para onde eu irei e outros belos olhos com quem dividir o calor e a paisagem. Espero que sim.

quinta-feira, abril 29, 2004

Ontem peguei de volta meu guarda-chuva que estava emprestado. Eu sabia, a terra me avisou de algum jeito. Agora chove e tem chovido o dia todo, mas eu estou bem protegido e aquecido. Assim, a chuva é bonita. Um descanso para todos os sentidos. A linda visão de serenidade, o som tranquilo, o clima ameno e o cheiro que sobe do chão onde ainda tem terra e capim. Arborização dos calçadões.

Mas a minha cabeça voa longe do chão. Numa montanha verde onde eu e meus amigos celebramos ao som suave de uma flauta e da chuva... Lá de baixo e de outras montanhas é difícil entender. Não culpo ninguém, ninguém sonegue me culpar. eu escuto algumas vaias, mas não me incomodam. Prefiro ficar por aqui, onde sou feliz.

Muitas coisas me distraem. Um pássaro alça vôo e me leva a correntes de pensamentos, versos, prosas, fotografias... A beleza das coisas me faz palpitar, mas eu me vejo forçado a me concentrar na feiúra, conviver com ela e dar mil voltas repetidas num quadrado. Uma moldura de foto ou de diploma, uma pose feliz. Uma pose. Enquadrado.

sexta-feira, abril 23, 2004

Após uma noite de sono conturbado, normalmente, uma camada mais espessa de ar fica presa nos pulmões. É um ar pesado, dificulta a respiração, me deixa lerdo e preguiçoso. Mas coloquei este ar pra fora com um grito que me contraiu todos os músculos e me despertou, como numa manhã de feriado nacional.

Ainda bem que ele veio. Eu tive um par de noites interessantes, muito parecidas, mas com gente diferente. Eu sempre tive poucos amigos, mas eram pessoas com quem eu podia contar. Agora sinto que posso oscilar entre os grupos sem perder a tal confiança. Me senti feliz. É bom conhecer gente inteligente.

Estou bem, mas ainda não satisfeito. É bom que eu já tenha a agenda do fim de semana completa, então o tempo dirá se, de fato, minha vida está começando a mudar. Mas eu sou eu, meu e quero mais.

segunda-feira, abril 19, 2004

Estava no saguão do prédio esperando o elevador, eu tinha uns 5 anos. Chegaram dois garotos que deviam ter a idade que eu tenho hoje, falaram de trauma. Um deles já tinha se encontrado com a porta de vidro daquele saguão, de bicicleta, e se cortado todo. Mostrou uma cicatriz no braço e outra na perna, apertou o botão do elevador e ficou esperando como eu. Foi nesse dia que eu aprendi o significado da palavra "trauma". Tive medo do trauma.

Sempre achei que eu era uma pessoa sem traumas, bem resolvido. Eu penso reto, simplifico as coisas e tudo parece até ser fácil... E os outros parecem pensar que eu tenho soluções. Eu só observo os ombros das meninas que vêm de camiseta reluzindo as lâmpadas frias da sala de aula. Meus ombros não andam erguidos, meus traumas devem estar tão intrínsecos que não consigo detectá-los. Não consigo dizer de onde os meus medos vêm.

Eu só encontro esse som que vem e me amarra por dentro, me carrega, me faz voar, cair no mar e me afogar, subir à tona secar na superfície do sol, queimar, congelar. E eu estou dentro de casa. Estou aqui querendo estar longe. Eu quero ir para longe, quero trocar alguns amigos, quero deixar de gostar de algumas pessoas. Gostaria de parar de discriminar os feios e acreditar na honestidade das meninas dos ombros bonitos, me sentir feliz assim e fazer uma serenata.

Para no dia seguinte acordar e encontrar as penas do travesseiro ao meu lado... E vem esse som que minha cabeça-rádio capta no ar e tenho medo de passar todas as minhas tardes assim... Preciso alcançar o coelho nas luzes do carro. Andar a pé na areia da práia, numa tempestade, de madrugada, ao lado de alguém. Minha respiração... já está... ficando... devagar... denovo.

quinta-feira, abril 15, 2004

Já voltei de viagem desde segunda-feira, mas ando um pouco automático esses dias, ruim para escrever. Tenho estado quase sempre em silêncio, ouvindo pouca música, sozinho, fechado no meu quarto com as companhias da internet, cochichando. Ando fazendo decisões para os próximos dez anos e destruindo-as no dia seguinte. As únicas coisas que permanecem são as dúvidas... O que eu vou ser quando crescer... O que eu vou fazer de bom amanhã...

Quando eu era mais novo, estava sempre na casa da minha vó paterna. Por lá passava todos os dias e no mesmo horário um vendedor de picolé da Kibon Sorvane muito simpático, eu conversava com ele e achava o máximo ele conhecer todos os tipos de picolés. Às vezes eu queria Chicabom, outras Frutare Limão e outras Frutare Cajá. Encontrei-o algumas vezes na práia da Barra também. E eu queria ser vendedor de picolé quando crescesse. Ninguém me levou a sério e esse meu sonho foi destruído pelo capitalismo.

Agora meus sonhos se passam durante as noites em que consigo dormir bem. Quando estou acordado, só tenho dúvidas em relação ao futuro. Tenho dito isso até demais.

quinta-feira, abril 08, 2004

Uma última olhada no oceano sob as minhas asas e parto para uma terra cercada de terra.

Vôo para longe deste lugar está me afogando. Para um pouco longe de tudo que tem estado um pouco grudado em mim, apesar das boas novas. Eu não estou mais nú, careca ou desdentado. Minha vida já começou de fato e n´~ao me permito voltar. Não se volta.

Então estou fugindo um pouco do cotidiano, vou ver umas paisagens novas, algumas obras primas da natureza, trocar violão e ter uma conversa honesta com o meu pai. Curioso que eu me sinta fugindo da rotina indo passear com o meu pai pelointerior, como já faço desde que posso me lembrar.

A verdade é que a vaiagem da minha mãe para Paris me endureceu um tanto. DEsde o último setembro que não a tenho em casa. Sem ela, as proibições e os cuidados, fiquei muito mais dono do nariz e me diverti b astante. Lidei com dinheiro e boletos bancários, passei sem pareto por esse tempo, mas sob os meus próprios cuidados.

Entao, indo encontrar meu pai, me sinto menos pesado nas costas, menos preocupado na testa. Estou no avião escrevendo numa folha de ofício. Em 90 minutos estarei digitando e publicando o texto.

Feliz páscoa para vocês!

segunda-feira, abril 05, 2004

Prometo um post de verdade em breve.
Ando meio atarefado, mas como não presto atenção às aulas de química, escrevi isso:

The Fall of Rebel Girl

You have no idea
Who you're messing with
Innocent child
Step back before it's too late

You still don't look like them
Don't surrender so soon
You may get trapped
For all your life

You were doing so good
Rebel Child
You were doing great
Why are you messing it?

You have no idea
Who you're messing with

Your addictions will have to change soo much
To get in they're vicious circus
In wich you'll start as a clown
And it never ends, rebel child

domingo, março 28, 2004

Estava frio demais, escuro demais, os crustáceos negros e cegos me mordiam a pele eu sangrava até o sal cauterizar as feridas completamente. Ardia como se o meu corpo estivesse todo aberto. E a alma estava toda aberta e sangrando. Ninguém ao meu redor. Ninguém. Eu ia implodir, não era mais possível.

Foi então que ela veio me salvar, veio linda e pura como eu queria. Com a harmonia daqueles que podem chegar nas profundezas do oceano e ainda se fazer propagar. Trazer a luz, a cura, a corda. Veio com todos os sentimentos nobres fazer carinhos nos meus ouvidos, antes que os tímpanos estourassem. Toda a minha explosão foi por ela e por ela eu subi para respirar e cantar a plenos pulmões.

Sim, amigos, foi a música que me resgatou.

"Eu corri pro violão num lamento e a manhã nasceu azul. Como é bom poder tocar um instrumento" (Caetano)

terça-feira, março 23, 2004

Espinhos, pedras, escorpiões... Não quero abrir os olhos, não adiantaria: é muito escuro. Não vejo nada, não sei o que me atinge. Vem de todos os lados, não sei como me defender. A pressão é enorme, parece que minha cabeça vai impodir. Não consigo nem mexer direito os braços, ir para frente ou para trás, para cima ou para baixo. Me lembro de músicas tristes, tento cantar mas nem a voz consegue sair.

Sim, amigos, é o fundo do oceano.

sexta-feira, março 19, 2004

Tenho tido sonhos com elementos parecidos: estações de trem, os trens mesmo, ônibus, avião... Envolvem alguns amigos que estou levando ou deixando para trás. Ocorrem também acidentes que eu posso ter causado no percurso, mas depois sempre descubro que não tive a menor culpa.

Não me lembro dos detalhes no último sonho, o despertador eliminou algumas lembranças com seu método prático e agressivo. Eu estou num avião, há algumas pessoas conhecidas, mas não me lembro quais. O avião tem dificuldades para pousar, está no rumo errado e entrando em contato com a torre para se orientar. Parecia uma situação difícil, mas mesmo assim eu me mantive confiante. O avião teve que fazer decisões e manobras várias vezes. Acabou pousando com segurança, mas numa pista normal, de trânsito. Imagino se atropelei alguém, mas aparece um replay que mostra as pessoas saindo dos carros. Não matei ninguém.

Acho que isso reflete as minhas dúvidas. Estou num vôo conturbado e posso pousar em várias pistas. Não sei direito do caminho para o pouso mais seguro, mas mesmo assim estou tranquilo e seguro. Depois da decisão tomada, tenho medo de ter errado. Posso me sentir culpado no futuro por ter estragado a minha própria vida. Desperdiçar minhas habilidades ou escolher um rumo infeliz.

Existem vários fatores e pessoas que podem envolver essa decisão. Amigos e mulheres (que também podem ser amigas) que eu amo e de quem vou me separar ou aproximar a depender do que faça. Mas meu raciocínio frio e lógico diz que isso não deve ser levado em conta, seria uma grande besteira definir minha vida por causa de uma pessoa. Ou não. Então não sei.

sexta-feira, março 12, 2004

Estou andando muito devagar. Eu sinto falta de duas meninas que faziam parte do meu dia-a-dia e agora sumiram. Fazem uma diferença significativa na quantidade de sorrisos verdadeiros diários porque eu adoro meninas lindas que sabem viver e que vivem livres. Não admiro a beleza delas como animal macho procurando um bom gen para passar para os descendentes, admiro a beleza, tanto de vida como estética, como um artista, como um poeta.

A primeira era de um humor muito abalável, mas na maior parte do tempo era, ainda deve ser, mas agora longe de mim, deuma alegria incomparável. Era toda de pulos, gargalhadas, abraços e danças. Apesar de termos várias diferenças de conceitos e modo de pensar, não podia deixar de admirá-la. E é linda.

A segunda... A segunda na verdade é a primeira em importância. O que senti por ela já me fez chorar no travesseiro, mas normalmente, em todo o resto do tempo, só me fazia sorrir, apesar da não correspondência do sentimento. Depois a paixão passou e nos tornamos muito amigos. Agora questiono se essa amizade era tão forte assim, já que, aparentemente, não resistiu. Me entristece e ainda me lembro dela todos os dias.

Foi com ela que tive coragem de tocar e cantar para um público numa apresentação. Foi ela que me ensinou que eu já sabia cantar e não precisava abaixar o tom do violão e nessa primeira apresentação eu tremi muito. Eu tremia quando falava em público e podia ser aprovado ou reprovado, não gaguejava, não errava os acordes, mas tremia. É chato. Depois disso minhas investidas musicais foram mais longe e eu tinha parado de tremer quase totalmente.

Hoje aconteceu uma apresentação semelhante e tremi como se estivesse nú no inverno da França. Sinto falta dela.

segunda-feira, março 08, 2004

Fui bem nas provas de ciências exatas. Sempre vou. O terceiro ano está se provando não tão difícil quanto eu previa, as minhas previsões em relação ao futuro é que estão desmoronando gradativamente. Não sei mais se vou conseguir ir pra USP, não sei se vou sair de Salvador, se vou continuar morando com minha mãe... Não sei nem mais se vou cursar jornalismo. Eu achava tão certo... Nada é certo, e isso é tão bom.

Se eu pudesse ver toda minha vida daqui de onde estou, até o fim, que graça teria viver? Eu estive até agora num corredor assim: sem portas. Agora estou chegando ao fim dele e as escolhas são tantas que me confundem. O medo é que eu fique parado. Que eu entre num túnel circular e fique repetindo trajetórias uma vez depois da outra sem saber que é só dar um pulo pra sair.

Só vou seguindo minha vida, um dia depois do outro e sem muita chance de mudar. Sonolento por um caminho ensolarado.

Desculpem a demora entre um texto e outro e a brevidade de cada um, não ando muito inspirado. Coloquei em versos a idéia do penúltimo post:

Impulso

Pedaços do casco do navio
E de coisa pior
Flutuando ao meu lado na superfície
Cheiram mal, fazem barulho

Os músculos estão tensos
Do frio e da luta
De uma guerra perdida
Da estrela contra os cegos

O mar, poderoso e imponente
Inteiro e de todo lado
Com sua grandeza e bondade
Me oferece a paz e o silêncio

Relaxo e me deixo
aceito a oferta generosa
Entro em harmonia com o oceano
E afundo suavemente

O descanso é valoroso
Preciosa a paz e o siêncio
POrém não são eternos

Tocarei o chão com os pés
E com o impulso saltarei
Para além das núvens

terça-feira, março 02, 2004

Em considerável profundidade, mas a luz do sol ainda chega onde estou. Ondas de luz e de música. Ligieramente destraído do tempo, do espaço e do esforço, parei pra observar os peixes dessa região do oceano. São diferentes dos que nadam lá em cima. Mais calmos e harmônicos. Deve ser pela ausência de humanos aqui. Eu não me mexo, entro na harmonia.

Estou com um blog novo e é bom estar animado com alguma coisa. O endereço está aqui. Dou minha opnião sobre o que ocorrer. Visitem.

Minha viagem ao fundo do mar continua.

domingo, fevereiro 29, 2004

Vários tocos de madeira flutuando e eu vou afundar mais uma vez. Não sinto mais vontade de respirar, não sei se a luz desse sol imenso é boa pra mim. Só o sal e a água do mar. Não tenho vontade nem fome ou sede. Não quero um balde de água no rosto, não estou dormindo ou delirando. Não sei chorar nem mentir. Nada me move do canto escuro do quarto, nada.

Eu vou afundar mais uma vez só pra me sentir solto como só posso dentro d'água. Só pra não precisar fazer esforço nenhum por algum tempo, porque se eu me mexer vou perturbar algum tipo de ordem, se eu nadar será para a superfície, o nível do mar, o ponto zero nem mais nem menos. O zero é uma algema presa a um cabo de aço. Me soltei e vou descer para onde os raios solares não me alcancem e eu possa viver no escuro, sem refletir luz alguma, sem nada.

Quando meus pés encostarem no chão, vou dar o maior pulo que alguém já viu, para além das núvens.

quarta-feira, fevereiro 25, 2004

É, eu fui para as ruas de Salvador ver os trios elétricos. Eu não tenho nenhuma aversão ao Axé, mas há algum tempo não se faz mais Axé de qualidade. Acreditem, paulistas, o Axé de qualidade existe. Nem sempre foi essa pobreza que reina no mercado fonográfico baiano. Por duas noites saí para a folia. Eu me divirto mais quando não tem nenhum trio passando e se está na espera do próximo. Nesses intervalos dá pra conversar normalmente e interagir com membros do sexo oposto com mais tranquilidade. Quando o trio chega, tudo se balança e se perde. Gosto também de andar de um ponto do circuito ao outro pelas ruas paralelas, onde estão barracas de drinques e muita gente interessante. Passei uns 40 minutos conversando com um catador de latas que se intitulava O Músico; tocava flauta ligeiramente bem, falava um pouco de inglês e francês, conhecia sambas antigos, bob marley, e bebia bastante. É o povo baiano.

No sábado fui para o Pelourinho, um centro histórico de Salvador. Lá eu pude ver um carnaval culturalmente muito mais rico. Blocos afro, tambores que tocam no fundo da alma e os negros mostrando seu teatro e dança com alegria. Turistas da alemanha trançando os cabelos em banquinhos de madeira, cordões de samba e proclamadores de cordéis. Ali estava um carnaval genuíno, tradicional e ainda muito vivo. Também é o povo baiano.

Depois me peguei cantando, sem perceber, "Na cadência do Samba". Encarei deliberadamente o refrão como uma premonição e fiquei longe das ruas. Fugi para Jauá: Sol, praia e tranquilidade. Nas cidades do interior, a programação noturna sempre é ir na sorveteria local, que todos dizem ser excelente (mas é normal), depois voltar pra casa e jogar dominó. Eu adoro dominó e paz. Ainda mais ouvindo músicas de qualidade com amigos significativos.

Já coloquei o despertador para às 6. É, porque o carnaval já acabou e amanhã eu tenho aula. Não quero ir, mas não quero ir nenhum dia. Só sei que devo e vou, quando chegar lá eu penso em algum jeito de fugir. Mas sinto que já será tarde. Já é tarde: eu já nasci. Não dão muita escolha às crianças, mas admito que a minha escolha teria sido essa mesma. Talvez eu tenha escolhido bem antes. Só me resta seguir o rumo normal dos dias. A segunda depois do domingo, a quinta depois da quarta-feira de cinzas.

sexta-feira, fevereiro 20, 2004

Começou o carnaval em Salvador. As pessoas estão todas loucas, as mulheres e os homens saem com o mesmo objetivo animal. A polícia aconselha cuidado: os homens fardados, armados de cacetetes, machucam o povo. Os ladrões, muito furtivos, roubam os pacatos cidadãos que assistem a festa. Os gays - e as bichas - perderam totalmente a inibição e se beijam à vontade. Os heterossexuais fazem até pior e sem o consentimento do parceiro. Os trios elétricos, o axé cada vez pior, homogêneo e menos inspirado. As músicas de carnaval realmente boas são anteriores ao meu primeiro carnaval, eu só vi sobras delas. Mas todos ainda fazem questão de tocar, nem todos sabem. Pra falar a verdade, tem homem-branco demais no carnaval.

As árvores e o capim da cidade, o mar e eu continuamos os mesmos.

E eu consegui escrever uma poesia:

A Ordem

Não era um berço explêndido
Mas uma boa idéia nasceu
sobre os homens que caminham
E os que esperam sentados

Os caminhos podem se extender
Além de onde já fizeram ruas
As pedras podem ser removidas
... às vezes elas nem existem

Ninguém nasce com amarras ou correntes
O que prende os homens são ilusões
Fidelidade ao brasão do fardamento
Tradições que não merecem viver mais

Não se prenda no chão
Com medo de outro tropeço
Um sábio já aconselhava
Levanta-te e anda

Ele disse:
Sejam livres, meus irmãos
Mas pensamentos ainda são queimados
Na fogueira da santa ignorância

domingo, fevereiro 15, 2004

Estou numa certa letargia de criatividade e acho que nem consigo escrever sobre isso direito. Já faz um mês desde os meus últimos versos e um pouco mais desde a última composição musical que foi até o fim. Acho que estou com o espírito ocupado de pensamentos medonhos, mesmo que eu não faça tanto assim durante as tardes. Os professores do 3º ano continuam tentando assustar e eu acho isso cada vez mais ridículo, estou cada vez menos preocupado e imagino se isso é bom ou ruim para a minha aprovação no vestibular, na qual eu tenho muito interesse. Terça-feira eu estava assustado.

Eu me imaginava daqui a 3 ou 4 meses; dentro do meu quarto, cercado por pilhas de livros e fórmulas de física, matemática, química e biologia espalhadas pelas paredes, o violão e a guitarra guardados no armário. Era o limbo. E todos em suas respectivas casas passavam pelo mesmo drama. "3º ano é morte lenta", eu pensava. Meu medo não era perder no vestibular, era ter um ano triste. Pra falar a verdade, o ano letivo começou mal. Não estou vendo boas novidades no meu círculo social, as caras continuam as mesmas e algumas ameaçam desaparecer. Eu deixo muito fácil as pessoas desaparecerem de minha vida, isso deve ser minha culpa. Preciso revisar minha lista de telefones. Sempre fui um menino de poucos amigos. Além do fator social, entrei no ano com uma das piores gripes que já peguei, já dura duas semanas mas parece estar no final. A gripe me mantém dentro de casa com medo de recaídas.

O cenário que se vê no meu quarto é bem diferente do apocalipse acima. O amplificador da guitarra está bem ligado, o livro com o marca-páginas não está na lista do vestibular (Noite Sobre as Águas, de Ken Follet. Ótimo romance.) e estou tranquilamente postando para o blog e ouvindo Los Hermanos. Estudei só um pouco essa semana, o que, comparativamente, é muito já que eu nunca estudei nem um pouco, a não ser quando estava mal em biologia no ano passado. Mas o professor de biologia desse ano é bem melhor. Estou mais preocupado em escrever músicas e poesias novas que em estudar mesmo. Eu não posso deixar de lado a banda, o mar ou o carnaval em nome da aprovação no vestibular. Posso conciliar os dois muito bem... Mas talvez eu fique um tempo longe do blog.

quarta-feira, fevereiro 11, 2004

Estou dormindo melhor e minha tolerância em relação às pessoas com que convivo melhorou. Elas só estão lá lutando por suas vidas, assustadas pelos professores e pelo tempo que deverão arrumar para tantos estudos. Assim como eu. Acho que estou na fase mais imediatista da minha vida. Tudo que faço e que estudo é voltado para o vestibular no final do ano. Se eu vejo o jornal na televisão, leio as revistas da semana, um livro, um conto, escrevo um post para o blog ou a resposta de um exercício, estou fazendo isso para o vestibular. E enxergo claramente a necessidade de tudo isso. De não relaxar e estudar como nunca estudei, e nunca estudei, para fazer a tal da prova. Todos na sala estão calados ouvindo o professor. Estamos na primeira semana.

Lembro-me da segunda série do primário. Era a primeira semana de aula e a professora me escolheu para entregar papéis. Era um dever de casa: palavras cruzadas e umas contas de somar. Todos acharam um absurdo. "Nâo pode, é a primeira semana de aula." Podia sim, e estava acontecendo. Era incrivelmente fácil responder, mas eu nem dei importância. Quem daria? Agora é a primeira semana do terceiro ano colegial, os professores mal tem tempo de dizer seus nomes e já começam com perguntas difíceis. E todos se esforçam para chegar às melhores respostas. Pode sim, está acontecendo.

O vestibular? Eu ainda não tenho certeza do que ou onde vou fazer. Sei que ele não me assusta. Sei que posso passar tranquilamente sem ter que arrancar os cabelos, é só ter responsabilidade. Será a última vez que terei que ouvir essas aulas sobre coisas que não me interessam. E depois sei que ainda vou me lembrar com saudades do meu tempo de colégio, dos meus amigos e das tardes de sábado que virão. Só tenho medo de não me divertir o suficiente. Estou olhando ao redor e não vejo novidades. Mas é melhor ter calma, ainda estamos começando.

segunda-feira, fevereiro 09, 2004

Estava num jardim, ou em qualquer lugar feliz e verde, não sei, não importa. Uma pessoa querida me fotografava com uma moderna Polaroid. Era uma polaroid, mas ela dizia que a foto seria digital e eu poderia ver na internet. Me pedia para olhar e sorrir e eu o fazia. Não por querer sair bem na foto, mas porque a fotógrafa era querida e ela ficava feliz em fotografar. Pena que era um cochilo e o cochilo acabou. Ainda estou na aula de física. Segunda-Feira, 9 de fevereiro de 2004, terceiro ano colegial, aula de física.

E me vi cercado por 40 pessoas toscas, amaldiçoei de uma vez só todos os seus sonhos e me diverti imaginando o que faria com uma metralhadora carregada. Foi um lapso de raiva, passou. A volta às aulas normalmente tem um clima leve e alegre, as pessoas se revêem, se abraçam, contam histórias bestas e os homens dizem que beberam muito e estiveram com muitas mulheres... Eu não estava interessado nas histórias de ninguém. E ninguém estava interessado nas minhas, mesmo que tenham perguntado, só queriam uma respostas simples e objetiva que não lhes gastasse muito tempo. Eu sou muito bom nisso. Já tinha revisto ou falado com todos os meus amigos antes de voltar às aulas. Alguns estão faltando perto de mim na sala. Alguns novos não me chamaram a menor atenção.

Esse ano, a volta foi marcada pelo medo, insegurança. Certeza de que será um ano difícil em que estudaremos um século por semana, que no final passaremos por uma fina peneira e que nem todos vão passar. Poucos vão passar. E depois daí vem uma nova vida. A bola de borracha vai explodir e não seremos mais um sopro, faremos parte do ar poluído da capital. E mesmo aqui tendo mar, verde e céu azul, vai ser difícil. Todos sabem que vai ser difícil e estão apavorados. Esse ano conclui-se uma etapa, e eu me vejo cercado por 40 pessoas toscas.

sexta-feira, fevereiro 06, 2004

Porta, janelas e cortinas fechadas, cobertor não sei porque, o corpo quente. Tosse cheia, viro para a esquerda, para a direita, deito de um jeito, de outro... Nada. Passei a noite inteira num estado de semi-consciência, perturbações, tormentos. Tosse, nariz entupido. Eu me imaginava num salão oval que era minha cabeça, estava confortável ou não a depender da minha condição de respiração nasal. A fantasia toda poderia parar se eu abrisse os olhos eu o fiz diversas vezes, mas voltava quando eu decidia tentar dormir novamente. Não dormi nem fiquei acordado.

Me via como se estivesse numa multidão, mesmo sabendo que estava sozinho deitado na cama, me sentia como se houvessem pessoas comigo e suas vozes ecoavam no salão oval, estavam todos lá... E como eu estava muito bem acordado, sabia que eram só uma criação louca. Falavam em roubar, vender, ganhar dinheiro, negociar... Era muito esquisito. Abria os olhos. Sumiam. Fechava. Voltavam. Não paravam de falar, às vezes até sobre o sono, sobre si mesmos... Tinham sempre uma idéia nova do que fazer: correr, jogar bola, pular carnaval... Cheguei a imaginá-los pequeninos andando pela minha cama como pequenos bonecos e cheguei a tentar pegá-los com a mão e jogá-los longe.

Essa alucinação durou mais ou menos 6 horas, eu diria. Já estava claro quando me levantei para ir ao banheiro, fui beber água e quando voltei consegui dormir bem. Deve ter sido a noite mais estranha da minha vida. Pelo menos quando acordei, me sentia melhor da gripe.

segunda-feira, fevereiro 02, 2004

A maior manifestação de união que já vi entre pessoas desconhecidas é a rodinha nos shows de rock. Pode parecer violento para quem vê de fora, mas eu já entrei num desses liquidificadores diversas vezes e nunca me machuquei, aliás, quando isso acontece com qualquer um, a ação se interrompe de imediato para socorrer o possível ferido. Os expectadores da Timbalada, por exemplo, costumam ser muito mais violentos e individualistas. Confie, eu já experimentei também. Por isso eu amo o Rock.

Nos últimos 5 dias eu assisti shows excelentes de Los Hermanos, Titãs, Rita Lee, Paralamas do Sucesso, Sepultura, O Rappa e Pitty. É o Festival de Verão de Salvador. Dizem que é o maior do Brasil em público, mas não estou seguro dessa informação. São 5 noites, cada uma com 5 ou 6 bandas de origens e estilos variados. Já é a terceira vez que compareço e sexta vez que o festival acontece. É uma grande festa onde os produtores ganham muito dinheiro e o público se diverte muito.

Estive lá todos os dias com um grande amigo, conhecido há anos. Gosto muito dele, porém, na maioria das vezes, nossa conversa se restringe à beleza e transitoriedade das mulheres em nossas vidas, num aspecto prático. Eu sou como um camaleão e algumas pessoas não gostam dessa minha característica, mas é essencial para se divertir com qualquer tipo de companhia. Eu me adapto, faço piadas não tão inteligentes e as pessoas riem. Muitas vezes eu desisto da possibilidade de convencer as pessoas de minhas idéias adversas, eu não tenho interesse em inserir meu modo de pensamento em ninguém. Mas não deixo de falar em algumas situações oportunas com gente disposta a discutir a beleza e transitoriedade das mulheres em nossas vidas, num aspecto filosófico.

Então esse amigo e os outros que comigo estavam não quiseram ir para o show do Sepultura, ficaram nas outras atrações do festival. Eu fui. E lá estava eu na roda desfrutando desse momento mágico, jogando aos ares pessoas desconhecidas no maravilhoso mosh. Vejo la uma silhueta conhecida, é o namorado da minha ex-paixão platônica e atual amiga, um cara muito legal. Nos comprimentamos e moça imediatamente veio até mim. Não nos falávamos desde que tinha viajado, era a única das pessoas importantes da minha vida com quem não tinha tido contato ainda.

Conversamos. Com ela e seu namorado, posso ser confuso e louco, posso discutir o assunto que eu quiser e me sinto bem assim. Dos meus vários Eus, acho que esse é aquele de que eu gosto mais. Ele se manifesta em outras companhias também, mas não ultimamente e eu estava sentindo falta de mim mesmo. Conversamos depois do show por algum tempo depois nos perdemos... Show é assim mesmo. Agora estou devendo alguns telefonemas. Viva a loucura, a liberdade e o Rock.

quinta-feira, janeiro 29, 2004

Nem todo mundo entenderia tudo que posso dizer. Com a maioria das pessoas eu não me dou ao luxo de ir muito longe nas conversações, me limito a discutir o futebol, o clima, o próximo show... Com algumas posso até discutir política e música, adentrar o terreno filosófico e platônico já com poucos, falar dos meus sentimentos com quase ninguém. Mas raras mesmo são as pessoas com quem eu posso ser confuso, soltar as palavras do jeito como subiram à garganta e esperar entendimento... No mínimo uma dúvida cabível e não uma expressão atônita e surda. Eu vejo muito isso.

Quando eu estava na segunda série, a professora fez com que todos os alunos lessem a mesma frase. Era uma frase moralmente importante para a formação de todos, suponho, mas não me lembro exatamente a origem disso. Todos os alunos antes e depois de mim leram a frase. Eu a disse, já a sabia de cor desde a segunda vez que tinha ouvido. Isso não parece ser nada difícil e não é mesmo, mas as pessoas liam, olhos grudados no papel e uma sílaba depois da outra devagar. Não é de se esperar mesmo que meninos da segunda série possam ler rápida e fluentemente. Mas havia um caminho mais rápido. Não sei porque não o seguriam, acho que ninguém pensou nisso naquela classe... Mas não é nada exepcional.

Anos mais tarde eu era primeiro ano colegial e o professor de geografia dava as pinceladas iniciais no quadro negro. Começou a fazer perguntas a várias pessoas sobre diferenças climáticas entre os hemisférios Sul e Norte. Aquela história de que quando aqui é inverno lá é verão e outras coisas baseadas no mesmo princípio. Todos se confundiam bastante na hora de responder. O professor não apontou a caneta para mim dessa vez, mas uma aluna nova no colégio teve sua chance de responder. A menina respondeu com a facilidade que cabe a esse tipo de pergunta. Sim, era mesmo muito fácil, mas ela me chamou a atenção. As outras meninas todas erraram algo, ou precisaram da ajuda do professor.

Duas semanas depois eu estava apaixonado por ela. Descobri enquanto assistia o enfadonho Assassinato em Gosford Park. Não conseguia parar de pensar nela. Aliás, foi por isso que iniciei minha carreira de bloggeiro. Com ela eu me sentia livre para ser confuso, para discutir política, música, filosofia e sentimentos. Para nós dois, as coisas corriqueiras como ler frases e responder perguntas de comparação climática não valiam conversa alguma. Pelo menos eu acreditava que ela também pensava isso. E acreditava que ela pensava todas as melhores coisas e nenhuma das piores.

Demorou, mas chegou o tempo em que toda essa idealização passou. Agora ela é a única pessoa importante para quem não telefonei ainda. Telefonei, mas ela não estava. O estranho é que me acostumei a sentir falta dela em todos os momentos em que ela não estava e agora nem sei se vou tentar ligar para ela de novo amanhã. É a vida...

segunda-feira, janeiro 26, 2004

Verde nas árvores. Há quanto tempo não via o verde nas árvores? Estavam todas secas no hemisfério norte. Foi com muita alegria que pisei em Salvador depois de 10 horas voando. O piloto anunciou: estávamos prestes a aterrisar, temperatura local 28 graus. Eu ainda estava com duas camadas de roupa sobre o meu corpo, era estranho me imaginar na rua só com uma. Vejo meninos de camiseta, shorts e sandália; não vão ficar gripados nem morrer de frio e isso é perfeitamente normal. Estou na Bahia, amigos, e a Bahia tem um jeito... A viagem foi ótima, perfeita, não poderia ter sido maior nem menor, deu tudo que podia dar e agora estou de volta. Nativo do chão onde piso, conhecedor das ruas e das placas... E pelo que me consta, ainda tenho duas semanas de férias. Já encontrei boa parte dos meus amigos, terei encontrado todos os importantes muito em breve. Tenho muito o que ouvir e muito o que contar.

Posto direito quando estiver melhor com as palavras, mas saibam que cheguei em casa, estou morrendo de calor mas estou feliz.

sexta-feira, janeiro 23, 2004

Minha jornada chega ao fim, estou satisfeito. Vou para casa com experiências valorosas e divertidas nas costas, não pesam. A mala volta da mesma forma que veio, não comprei nenhum souvenir para mim nem para ninguém. Os novos CDs vão na bagagem de mão. Devo lhes dizer agora, no fim o que achei de Paris.

A primeira coisa que me chamou a atenção nessa cidade foi o sistema de transportes. Para quem vive em Salvador, onde só existe o sistema de ônibus falho e mercantilista, o metrô é uma gratificante surpresa. Paris é uma cidade ótima para o seu ego urbano: estou numa metrópole mundial e me locomovo com facilidade de uma ponta a outra da cidade sem ter que perguntar nada a ninguém. É bom. É barato.

Notei depois de andar mais um pouco que a cidade é, como dizem, linda. A beleza aqui brota do chão, das paredes, dos olhos azuis das moças, das sacadas, do teto, das vitrines. Paris é absolutamente linda, magnífica, grandiosa. Paris é um colírio.

Os parisienses é que não colaboram, "porque nada é perfeito", ouvi por aí. Mal humorados. Entram e saem dos lugares com sacolas, problemas... e livros. São muito esquisitos. Procuram sempre a linha de visão onde há a maior distância entre eles e os próximos. Principalmente com os turistas, mas também entre eles mesmos. Olham para baixo, para o outro lado ou para seus livros, revistas ou jornais. Lêem muito e falam muito pouco, são excessivamente presos às regras e convenções. "Se fossem legais seria o paraíso, e o paraíso não está na terra."

Existe porém, um nicho de resistência à chatice dos francêses, esse nicho se chama Cité Internationale Universitaire de Paris. Felizmente, foi onde eu passei a maior parte do meu tempo na França. Funciona assim: É um lugar enorme, um parque, onde vários países tem suas casas representantes, originalmente para abrigar estudantes de sua nacionalidade, mas hoje em dia, tudo é misturado. A Cité tem uma programação cultural intensa: tem dois teatros que sempre estão com espetáculos de dança, música e teatro, cada Maison propõe suas festas, shows e tudo mais. É um lugar que tem a felicidade de estudantes do mundo todo. Um contraponto aos cabisbaixos franceses. Aqui frequentei muitas festas e conheci pessoas interessantes.

Paris, na balança, não é um lugar ruim para se morar. É uma grande metrópole de onde se tem acesso à cultura do mundo inteiro através de museus, centros de cultura, bibliotecas etc... O estímulo e investimento na cultura aqui é muito forte, por isso, artistas e estudantes do mundo todo vêm para cá. É uma cidade densa, pesada, mas não é ruim. Porém, existem melhores. Em Londres e Bruxellas, por exemplo me senti muito melhor, o ambiente é melhor. Mas a beleza de Paris, não se encontra em outro lugar. É o melhor das arquiteturas e artes plásticas humanas, mas volto para o Brasil, onde vejo da melhor arquitetura da natureza.

Paris, au revoir!

terça-feira, janeiro 20, 2004

Quando eu voltar pro Brasil, farei um novo template e colocarei links para Dani, Canjicas, Ele e Ela e outros de que não me lembro agora, novos leitores que vieram com o ano novo (curiosamente, sempre no inicio do ano tenho esse tipo de novidade).

Mas o que eu vim dizer é que os vídeos da minha visita à europa estão na internet.
O dia em que nevou (apx 4 mb)
No topo da torre Eiffel (apx 3 mb)
O Stonehenge (apx 4,5 mb)
Fim de semana em Bruxelas (apx 11 mb)

Divirtam-se.

domingo, janeiro 18, 2004

Intenso. Me disseram para viver meus derradeiros dias na Europa de forma intensa, então eu vou contar o meu fim de semana. Sexta-feira à noite fui para uma festa que os residentes daqui organizaram. Entraram pessoas pela janela, a sala estava apertada e o DJ não vacilou. Festa acabou cedo, mas umas honrosas pessoas não estavam satisfeitas. Quarto 346, Pink Floyd, violão, uma garrafa de whisky, uma italiana lindíssma com um piercing no nariz dizia que Veneza estava desaparecendo. 3:46 AM, eu tentava dormir.

7:26 AM, acordo. Tenho um trem para pegar, Thalys para Bruxelas. Vamos lá. Estou acabado, mas vamos lá. Vomitei no trem. Não em cima das pessoas, tive a prudência de ir ao banheiro. Depois melhorei, pálido e faminto, mas disposto. Bruxelas.

Bruxelas é linda, tranquila, muito fria nesse FdS, as pessoas são legais... É a cidade mais Européia em que estive na minha viagem. Paris e Londres tem muitas influências do novo mundo, Bruxelas é meticulosamente européia, as pessoas usam casacos escuros, tem as bochechas rosadas, o sol faz um amarelo bonito quando bate nos edifícios. Nada de vermelho Coca-Cola ou de McDonnalds. É uma cidade pequena, só tem 140 mil habitantes e meu palpite é que tem mais turistas ou gente à negócios que moradores por metro quadrado no centro da cidade. A sede da União Européia, o menino mijão, uma molécula de ferro aumentada 200 bilhões de vezes, a Grot Markt, linda praça com construções impressionantes e restaurantes não tão caros como o esperado servindo muito bem. Boas cervejas.

Um fim de semana foi suficiente para passear por bruxelas. Se ficasse mais tempo lá já não teria mais nada interessante para ver, a cidade é pequena, vi todas essas coisas a pé, só andei de metrô da estação até o hotel e volta. Me senti mais europeu lá que em Paris. Agora estou de volta para a última semana. Tenho mais 5 dias, 6 noites e uma manhã. E volto para o Brasil, então vou adiantando como meus dias serão: intensos.

quinta-feira, janeiro 15, 2004

Devolveram meus óculos. Só os óculos. Telefonou um moço dizendo que o havia encontrado no restaurante. Ficam duas hipóteses: O rapaz que pegou meu casaco deixou os óculos lá e inventou a história ou deixou displicentemente os óculos no restaurante, e um rapaz nobre o levou ao achados e perdidos e telefonou para cá guiado pelos anúncios. Não importa. Tenho meus óculos de volta. O incidente da perda do casaco (vide post 03/01/2004) acabou sendo bom no fim das contas. Eu fiquei bem triste e cabisbaixo nos dois dias que se seguiram, mas depois recuperei o ânimo e fiquei ainda melhor do que estava antes. Não deixei de ir às festas, o barman já brinda comigo e tenho um grupinho internacional com que estar.

Ontem fui a um concerto de jazz e música sul-americana na maison da Argentina, mas que não teve jazz nenhum. Tocaram (mal) 12 músicas, dessas todas, 6 eram do Brasil. Ouvi com muito gosto amostras da genialidade de Gil e Caetano. Aliás, uma coletânea de Caetano estava como destaque na loja principal da Fnac. O Brasil é, culturalmente, muito respeitado aqui. Não só no campo da música, mas também na dança, teatro e TV. A globo é bem cotada entre as pessoas latinas e algumas pessoas chegam a saber nomes de atores brasileiros. Muito me alegra.

Começo a sentir falta da Bahia, do calor do sol e das morenas do sorriso largo. Começo, ao mesmo passo, a gostar bastante da vida aqui dentro da Cité Universitaire Internacional. É um lugar enorme onde vários países tem suas casas, originalmente para abrigar estudantes compatriotas, mas acabou-se misturando tudo. Aqui na maison inglesa tem 6 brasileiros. É um lugar de clima muito leve e eu ando tranquilo. E os universitários festejam muito.

Ontem fui à mais uma festa na maison Deutsch, encontrei meus amigos brasileiros, ingleses e de todo outro canto. Estou em contato aqui com pessoas que mergulharam totalmente na vida no exterior. Uma moça que está na inglaterra há 7 anos, desde os 14, estuda psicologia em Oxford e está fazendo algumas matérias em Paris (que é o maior centro de psicologia do mundo, segundo ela), outro que estuda na África do Sul há 3 anos e veio completar o curso aqui, uma que ganhou uma bolsa na holanda e vai direto para lá... E eu com meus 17 anos vendo o mundo todo dançar num porão, com saudades da Bahia e pensando no vestibular do fim do ano, se vou fazer Jornalismo ou Comércio Exterior, se vou fazer na Bahia, em São Paulo, em Brasília... Pensando de longe em Londres. Pensando nos meus amigos, no carnaval, grande e pequeno, muito e pouco.

Veremos a mesa que a vida me reserva para o almoço. Eu ainda estou no café da manhã, mas acredito que já acordei e lavei o rosto.

domingo, janeiro 11, 2004

Estava ali sentado na poltrona, o notebook ligado porque é o único aparelho que toca CD no pequeno quarto onde estou vivendo. Eu lá sentado de meia, porque durmo no chão e não é bom entrar com o tênis. Tinha acabado de chegar, tirado o tênis e o casaco e estava decidindo que gostava de água Perrier, que The Bends (Radiohead) é a melhor aquisição que fiz aqui e que a música de mesmo nome vai entrar no repertório da banda assim que eu chegar no Brasil e retomar os ensaios. Queiram os outros ou não.

Eu tenho feito coisas interessantes, vivido aqui. Não estou visitando a cidade, estou morando de férias. Acho que vou sentir saudades daqui quando voltar. Do clima universitário (que eu vou acabar recuperando dentro de um ano, se tudo correr como o esperado), do ônibus impecável, de algumas pessoas que conheci aqui e que, provavelmente, não verei outra vez na minha vida... Estranho, mas eu sei que todas as pessoas que conheço aqui na Cité Universitaire são totalmente temporárias, totalmente indispensáveis para o bom proveito da minha estadia. Eu gosto delas, mas sei que não haverá pombo correio nesse mundo que nos mantenha unidos.

Minha viagem agora está acabando. Ainda tenho muito tempo, mas ela já terminou de começar e começou a terminar, a contagem é regressiva. Duas semanas. No próximo fim de semana vou a Bruxellas, é uma cidade pequena e o tempo será suficiente. Eu quero ver, ouvir, tocar, cheirar tudo que eu puder. Quero ir comprar pão, passear pelo parque, ver o pôr-do-sol num dia bonito, exercitar minha socialidade, minha solidão, meu corpo contra o frio, contra outro. Ver todas as construções mais lindas da cidade, tomar vinho, comer pão e ver os vitrais das igrejas góticas. Comprar um calendário bonito e em preto e branco.

Voltar pro Brasil novo, respirando e pensando de maneira mais abrangente, livre. Rever as pessoas que eu amo, ir à práia da Aleluia, ao boteco da Ladeira da Barra, ao Parque de exposições, voltar ao meu quarto e marcar mais um dia no calendário bonito e em preto e branco. Mas saibam que eu estou gostando daqui.

sexta-feira, janeiro 09, 2004

Confesso que no início concordei com a medida do juiz mato-grossense, mas depois de muito pensar e de, é claro, ser massivamente manipulado pela imprensa européia, eu vejo que o Julier Sebastião fez uma grande besteira, colocou o Brasil numa situação delicada e ainda deixou claro que a nossa Polícia Federal tem diversas carências.

Diplomaticamente, demonstramos infantilidade. Os EUA estão cadastrando todos que entram para se defender de terroristas e estão fazendo isso com todos os imigrantes que precisam de visto, Brasileiros mais uma centena e meia de nacionalidades. Aliás, eles extenderam o cadastro mais rigoroso por temerem acusações de preconceito vindas dos países muçulmanos, obviamente a fonte maior de pessoas que odeiam os norte-americanos com todo o coração que Alah lhes deu.

O Brasil só está cadastrando os americanos, que teoricamente não oferecem nenhum risco ao país e ainda trazem dinheiro, enquanto colombianos, bolivianos e outros entram livremente com as bolsas cheias de cocaína e levam o dinheiro dos filhinhos de papai. A polícia federal poderia estar dando atenção maior ao tráfico de drogas, que é o nosso grande problema (se não o gerador dos nossos grandes problemas), se não fosse essa medida estúpida do juizinho. Medida, aliás, que inflou o ego nacionalista e anti-americano de muita gente do Brasil, o que, no final das contas, reforça a razão dos americanos em fichar os brasileiros.

O cadastramento que acontece nos Estados Unidos não é brutal, xenofóbico e nem um pouco parecido com o que os nazistas fizeram, como afirmou o juiz. O cadastramento lá dura minutos, é todo digital e eles se prepararam para fazê-lo com muita tecnologia. Eu pessoalmente adorei tirar minha impressão digital à laser no museu da ciência em Londres. No Brasil, o processo é brutal. Os americanos cheios de dólares são forçados a ficar horas esperando enquanto um Federal com uma câmera digital e um papilocopista tiram sua foto e impressão digital no papel, sujando a mão de graxa e tudo mais. Os documentos arquivados aqui no Brasil não servirão para nada. Nos EUA, eles estarão para sempre arquivados no sistema e sempre que alguém voltar lá, seus dados anteriores serão vistos.

Brasileiros, enxerguem um palmo na sua frente. Essa foi só uma medida de segurança normal que eles tomaram com muito esforço e dedicação para fazer bem feito e rápido, e conseguiram. É só uma medida de segurança e é o futuro da imigração no mundo. Daqui a alguns anos, passaporte de papel? Pra que? Tenho um visto eletrônico e minha digital e foto estão no sistema. Não corro o risco de perder o passaporte, ningém vai falsificar meu documento, e posso fazer meu passeio turístico tranquilamente a custo de 30 segundos a mais no processo de imigração. E estamos reclamando.

terça-feira, janeiro 06, 2004

Pensei em escrever um post de opnião sobre essa história das impressões digitais, mas preferi postar isso ai:

Hoje é dia de trabalho aqui em Paris, terça-feira. As férias já acabaram e tudo já voltou a correr como sempre. E eu fico abandonado porque não estou convivendo com turistas e sim com moradores da cidade. Comecei o dia em casa, na cidade universitária matutando sobre o que faria. Fui procurar os brasileiros no campo de futebol, mas lá só havia crianças e o que eles faziam não se parecia muito com futebol. Tudo bem. Vou pegar um ônibus.

Pegar um ônibus. Só isso. Simplesmente passear pelas ruas e sentir o cheiro da cidade, ver as pessoas entrando e saindo com suas sacolas e problemas. E o ônibus aqui em Paris é muito bom. Confortável. Peguei o ônibus aqui na cité e o plano era ir ate o fim, mas acabei descendo no Jardin Du Luxembourg porque o dia esquentou e ficou viável andar pela rua sem medo das orelhas congelarem. Tirei algumas conclusões interessantes.

No jardim tem um pequeno lago onde há pelo menos 3 especies de patos. Inclusive aqueles da cabeça verde que aparecem em desenhos disney, e sao daquele jeito mesmo, garças e corvos, como são elegantes e vistosos... Uma aglomeração dessas aves num canto do lago, logo percebi o motivo: crianças atiravam pedacinhos de pão. As aves sao estúpidas. De mim que nao tinha pao nenhum, elas fugiam. Do menino que dava pao elas se aproximavam. Acho que nunca estive tao perto de um pombo na vida quanto estive quando me aproximei do menino dos pães... Por isso os patos nao dominam a terra. (Conclusão 1)

Entao saí do tal jardim por um outro portão menos badalado. Andei um pouco pelas ruelas até constatar que não sabia onde estava. Mas é claro que sabia: estava em Paris. Basta. Continuei. Vi uma faculdade de direito feia. A primeira construção irrefutavelmente feia que vi em Paris. Para piorar, a porta estava cheia de anuncios, aparentemente uma eleição de diretório acadêmico estava por vir. E descobri que essa faculdade feia era a mesma que tinha visto outro dia, que tinha uma fachada greco-romana linda do outro lado com os dizeres da revolução. Paris também tem uma porta dos fundos. (Conclusão 2)

Seguindo meu caminho, passei por uma escola aparentemente secundarista. Estavam saindo varios estudantes, eu me juntei a eles e andei. Quem olhasse de fora talvez pensasse que eu pertencia ao grupo. Era um grupo de adolescentes bem comum. Umas francesas bonitas cochichavam entre si, franceses branquelos discutiam provavelmente futebol, porque ouvi falarem "Zidane" e "Real Madrid". Enfim, eram pessoas alegres e não moribundas e mal-humoradas como as crianças que costumo ver aqui. Então tem gente feliz morando aqui. (Conclusão 3)

Andei um tanto mais, meio perdido, e fui parar no portão principal do Jardin du Luxembourg. Ótimo. Para completar encontrei pixações no ponto de onibus. Falavam de liberdade, somos todos humanos, iguais e devemos ser solidarios e nao podemos deixar a maquina capitalista nos dominar e bla bla bla. Em Paris também há rebeldes (conclusão 4) e eles tem o mesmo discurso besta dos nossos (conclusão 5)

Paris vive.

sábado, janeiro 03, 2004

Pior do que voces pensam.

Eu sou um cara controverso. As vezes me considero muito sortudo, as vezes muito azarado. Vi os anuncios quando fui almoçar no refeitorio universitario. Festa de ano novo na noite do dia 2 de Janeiro na casa holandesa. Legal, mas nao vou. Estava em casa de bobeira, jogando campo minado e ouvindo musiquinhas tristes do RadioHead. Decidi ir. porque nao? Vou, vejo o clima e se estiver chato eu volto. Cheguei, coloquei meu casaco no cabideiro e fui sentindo o espirito. Nao estava chato.

Tocava de tudo na festa, Techno, Dance, House, Trance, Hip Hop e ate Greenday e Nirvana... Começou a tocar musica latina, que eu detesto, entao sai um pouco. A cerveja francesa é muito ruim, mas nao tinha outro jeito. Quase pensava em voltar... Eis que encontro um grupo de Brasileiros(as) do lado de fora em situacao parecida. Pareciam ter minha idade e aos poucos fui conhecendo-os. Fiquei na festa até o fim, momento glorios quando tocou a musica do D2, Qual Eh, que os 10 brasileiros cantaram bravamente no meio de varios que desconheciam a cançao, mas dançavam entusiasmados. Pontualmente às 4 da madrugada a fes ta acabou.

Fui pegar meu glorioso casaco e... Ele nao estava la. Tradicionais reclamaçoes com o anjo da guarda do tipo "isso so acontece comigo" aconteceram. Mas logo recobrei a consciencia do ridiculo (mesmo que ninguem pudesse ouvir minhas lamurias). Se nao foi nenhum ladrao, um casaco parecido havia de sobrar. Fiquei ate a ultima pessoa sair. Os brasileiros, muito gentis, me esperaram. Sobrou de fato um casaco similar... Na verdade, o grande problema nao é o casaco, sao os oculos e a carte orange (um bilhete de metro que vale por um mes). Ha um mes eu tinha dois pares de oculos. Agora nao tenho nenhum. Como esotu em terras civilizadas, é possivel que eu recupere o tal casaco, tomei varias providencias nesse sentido.

Depois sai com os meus conterraneos e fomos ate a casa do Portugal com um caboverdense. La tinha chips e um Violão. Não era dos melhores e faltava uma corda. Mas ja ha um mes eu nao tocava e minhas maos estavam sedentas.Toquei, toquei, toquei... E cheguei em casa às 6 da manhã.

Então uma duvida me assalta. Foi a noite mais divertida que tive desde que cheguei aqui na Europa, mas o prejuizo financeiro foi grande se o casaco não for recuperado. Então valeu a pena ou não? Seria melhor ter ficado em casa? Creio que a resposta certa é não. Fiz a coisa certa e não foi minha culpa algum bebado ter levado o meu casaco. Ainda conheci umas pessoas legais e toquei violão. Mas na compensação das coisas, lucro ou prejuizo?

quinta-feira, janeiro 01, 2004

Não resisti e ignorei os conselhos de viajantes mais experimentados. Fui para Champs-Elysées (onde fica o Arco do Triunfo) no Revellon. Fomos eu, o amigo de minha mãe que me hospedou no seu lar até que eu pudesse ficar aqui na universidade e sua filha, uma menina de 12 anos, terceira do casamento dele com a mulher que ficou em casa com minha mãe esperando agente voltar (antes de meia noite), para estourar a champagne. Saímos de casa por volta das 9 horas. O metrô, gratuito nessa noite, estava lotado. Fui me apertando com gente de toda nacionalidade, cultura, cor e tamanho. Champs-Elysées (campos elísios) fica na última estação desse trem, Étoile (estrela). Chegamos na estrela, bravamente.

O clima era aquele de ante-festa que eu adoro. A rua estava fechada para os carros, então pude andar pelo meio da gloriosa, e linda, avenida vendo grupos de bêbados, sóbrios, argelinos com tambores, moças de saia (não sei como, nesse frio), casais e grupos maiores. Gente nas beiradas da rua vendendo cachorro quente e cerveja, sem isopor porque o ar já é um bom freezer. Eu gosto do cheiro dessas coisas, simplesmente... Festa de largo, gente por aí correndo, pulando, fazendo barulho. Ouvi algum barulho! Paris deve ser a cidade mais silenciosa em que já estive. As pessoas não falam, não assoviam, não cantam, mas nessa noite sim. Nessa noite, havia festa. Suspeito que não haviam muitos franceses lá...

Pegamos uma rua transversal que ia dar em Trocadéro, um ótimo lugar para se ver a torre Eiffel, fomos andando, vendo o movimento aumentando, policiamento, lugares fechados... Quase me senti numa manhã do carnaval baiano, quando ainda não saiu nenhum trio elétrico. Quase. Era noite, era frio e as pessoas invadiam a McDonnalds. Chegamos ao local desejado, a torre estava toda iluminada e as pessoas alojavam-se ao seu redor para ter um bom ângulo dos fogos quando o ano virasse. Quando deu 11 horas, a torre começou a piscar de luzes brancas, a reação do público foi um interessante e sonoro "ohhh!", mas a torre sempre faz isso de hora em hora em qualquer noite.

Satisfeitos com nossa vistoria, chegamos à estação do metrô. Para voltar não estava cheio, deu para fazer o trajeto tranquilamente. Quando chegamos em casa, faltavam 20 minutos para a meia-noite. Dois dedos de proza e estouramos a champagne. Feliz ano novo.

Aqui não existe a tradição de se vestir de branco no ano novo, mas eles acabaram tendo que ver o primeiro dia do ano amanhecer alvo em todas as direções. A natureza, sábia, cobriu a cidade de neve. A neve. A dama mais elegante de Paris caindo em seus flocos harmoniosos. Ela cai devagar, desfilando, pra lá e pra cá, e nas calçadas, nos telhados, nos galhos das árvores, na minha mão... O ano começou... De branco.