terça-feira, outubro 14, 2008

Um pouco maior

Lembro de quando eu era criança e era poeta, que as minhas poesias mais tristes nunca acabavam mal. "Quando meu pé encostar no fundo do poço, saltarei para além das núvens", eu dizia. Pois é mesmo: não se pode, sem chão, saltar a lugar algum. Fazia isto porque não me apetecia mostrar fraqueza, não queria preocupar os meus pais.

Depois parei de me articular tanto e comecei a resumir um pouco mais as coisas.

Aconteceu que eu, que sempre achei que me pertenceriam fatalmente as núvens, tive um estalo e desacreditei de todos os ideais de sucesso que eu conhecia. Claro, muito claro, nenhum deles me significaria a felicidade, no máximo uma satisfação tola, enganada e efêmera. Pra quê tudo isso, afinal? Pra quê idealizar o sucesso em uma civilização tão tristemente propensa à violência, a sentimentos tão destrutivos?

Me vi esvaziar de vontades, porque nada fazia sentido alcançar. Minha insônia deixou de ser romântica para se tornar insuportável, e insones não só não dormem: tampouco ficam acordados. Minha existência, por um instante, se tornou banal, indigna de si própria. Tornou-se feia.

Ocorreu que numa noite de vigília me deparei com um trecho de Nietzsche:

Pode-se considerar o embelezamento como a expressão de uma vontade vitoriosa, de uma coordenação mais intensa, de uma harmonização de todos os desejos violentos, de um infalível equilíbrio perpendicular. A simiplificação lógica e geométrica é uma consequência do aumento da força.
E me lembrei de como fui belo quando desejava vir pra onde estou.
Na mesma noite, digamos que por coincidência, eu voltei a desejar. Já me sinto um pouco maior.

A insônia não, a insônia continua.

sexta-feira, outubro 03, 2008