quinta-feira, dezembro 30, 2004

Quando leio durante a tarde na varanda sempre sobe um cheirinho bom de comida. Algum vizinho de baixo cozinhando. Sei que vem de baixo porque cheiros dificilmente desceriam, são as leis da física. Na escola, eu aprendi as leis da física. Eu aprendi várias leis. Realmente tomei gosto pela leitura e pela minha varanda nesta reta final de vestibular, por necessidade, mas com prazer. Depois da hora em que o céu fica amarelo e a luminosidade não machuca mais meus olhos. Pois apartir de então, serei um leitor. É minha resolução de ano novo. Embora seja muito clichê a resolução de "ler mais"... Qualquer resolução de ano novo é clichê.

Não vou resolver nada só porque é o fim do ano. Não faz sentido. Vou ler mais apartir de hoje. 30 de Dezembro.

Nem vou lhes fazer uma retrospectiva dos principais fatos de minha vida pessoal em 2004. Vou falar do agora.

Eu tive um sonho hoje à tarde em que eu pulava do alto de um prédio para o prédio vizinho, numa altura maior. Meus amigos ficavam olhando lá de baixo e eu dizia que não tem volta. "Se eu tentar pular daqui, estarei morto. O que fiz foi suicídio." É isso que estou fazendo. Me morrendo, me nascendo outro. Impossível voltar para o ponto inicial, impossível continuar nesse prédio onde vocês, meus velhos amigos, estão. Me mudando. Todos os dias, o tempo todo: quais são minhas resoluções para este minuto novo?

Cada vez que vejo um colega de escola, penso que pode ser a última vez. Hoje foi a última vez que vesti a farda do colégio onde estudei por 13 anos. As coisas estão tendo um fim, estou indo para um outro patamar. Não... Não é um patamar, não é uma situação reta. Estou indo para uma situação totalmente diferente, uma onda, um risco, o topo de um prédio de onde eu não posso voltar.

Ninguém tira de mim a minha história. Nem o meu futuro.

segunda-feira, dezembro 20, 2004

Dogville...

Não costumo incomodar as pessoas quando estão lendo. Aprendi a respeitar este momento. Ninguém nunca me fez grosseria quando eu ainda não tinha noção disso, então acho que aprendi a não incomodar sendo incomodado. Não incomodo, mas se eu estou lendo e alguém me chama, procuro ter paciência. Pode não parecer, mas me tornei uma pessoa muito paciente. Entendo muito o lado dos outros, às vezes vendo inocência no que foi feito por maldade. Não julgo nem penalizo os outros com o mesmo rigor com que os faço a mim mesmo.

Assim, perco muito.

Lembro-me da reflexão que fiz sobre a minha mãe, sobre condescendência, sobre entender o lado dela. Meu pensamento mudou um pouco depois de certos episódios. Quando eu era mais egocêntrico, as coisas eram mais simples. Comecei a entender melhor a minha condição e a dela, passei a agir de maneira diferente. Houve alguns abusos de autoridade e de minha boa vontade.

Hoje ela chegou zangada, reclamando de tudo, perguntou, quase aos gritos, porque havia um refratário cheio de água no fogão. Não respondi. Disse que só responderia se ela me perguntasse com calma e tranquilidade, que eu não tinha nada a ver com os motivos daquela irritação. (Coisas que, aliás, eu digo pra mim mesmo quando estou aborrecido com terceiros).

A manifestação não foi bem aceita, mas a mudança se processa aos poucos.

Um menino no prédio do lado acaba de chutar a bola num matagal, os outros meninos caçoam. O dono da bola pensa se esta será recuperada.

Estou começando a entender melhor as coisas, de novo.

Ela bateu na porta do quarto agora e pediu desculpas, ainda com rispidez.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

Olho pela janela e passa um helicóptero. O céu está azul bem clarinho e o sol está naquela hora amarela bem bonita, quando tudo fica colorido. Daqui eu vejo, nos arredores do meu novo bairro, crianças brincando na piscina, umas mais velhas numa quadra de futebol, outras num campo, outras no chão de mármore branco, simplesmente correndo. Criança gosta de correr. Eu mesmo gostava, entrava em contato com o ar, interagia com ele e o suor só vinha depois da parada.

Passei a tarde inteira jogando fora alguns pensamentos que não me servem mais. Alguns pensamentos não me serviam mais. Agora, não existem mais. Deitado, sentado, em algumas posições inomináveis, sobre o meu novo colchão de um metro e dez de largura. Houve um instante em que cantei com tanta força, com tanta paixão, que me arrepiei. Já não cantava tão alto há muito tempo: tem coisas que só se consegue sozinho. Sozinho, eu consigo deixar a janela e a porta aberta para deixar todo o vento do mundo passar por aqui. Eu, então, respiro o vento do mundo todo.

Um bom livro me acompanhou e acho que termino-o ainda hoje. Ignoro a obrigação da leitura buscando nela algum prazer. Encontro fácil. Eu não sinto que fiquei em casa o dia todo sem fazer nada. Eu fiz muita coisa, eu estive em duas décadas diferentes, passeei pelo Rio de Janeiro enquanto ainda era uma cidade pacífica, vi o carnaval bonito e voltei para o meu século, bebi um copo d'água, estou em Dezembro. Uma das melhores tardes dos dois tempos.
A amizade é uma coisa deveras interessante...

Mesmo eu sendo esse sujeito estranho, de outra esfera, como disse a Madam, tem gente que gosta de mim, que se importa comigo e que faz coisas legais que eu não faria por elas. Não por maldade, mas por não fazer idéia do quanto essas coisas são legais. É que eu não sou daqui...

São legais. Eu fiquei contente, mesmo tendo sido acordado desumanamente às 8 da manhã.

Passei na primeira fase da Unicamp. A segunda, pode vir quente que eu estou fervendo.

domingo, dezembro 12, 2004

História...

Me perguntam às vezes porque eu guardo as partes desse prendedor de cabelo quebrado. Eu não respondo a verdade, sempre invento qualquer coisa ou desconverso, mas eu guardo para me lembrar... E eu me lembro bem.

Quando eu estava confiante para fazer todas as coisas certas... Estávamos sentados no terraço de uma pequena casa de shows, havia grupos de maconheiros, de conversadores, havia nós. Ele era meu amigo e não a conhecia, conhecia, porém, os meus anseios. Advinhou, sem querer, a data do aniversário dela e apartir daí a moça se encantou. Fiquei muito ciumento e perdi toda a confiança que tinha no caso, para não recuperá-la nunca mais.

Depois, não adiantava mais evitar porque ela perguntava por ele. O rio seguiu seu curso e não haveria de chegar noutro lugar que não o mar. Eu percebia tudo, porque tenho esse costume de ver por dentro das ações simples. Eu já estive nessa condição, eu sei como é. A gente faz as coisas com um único objetivo, depois fica tentando convencer aos outros e a si próprio de que foi por acaso ou por algum outro motivo besta, mas é porque a gente queria estar por perto mesmo, não há como negar.

Eu ficava tentando inventar coincidências entre nós dois, algo que superasse a advinhação do aniversário, era inútil.

O prendedor de cabelo quebrado, que eu guardo até hoje entre alguns ítens exóticos que colecionei nas terras por onde andei, serve para eu me lembrar. Eu errei. Eu sei que errei e errei por muito. Que eu devia ter, há muito tempo, dado o segundo e o terceiro passo, mas fiquei parado. Serve para eu me lembrar de nunca mais demorar tanto para falar algumas coisas, porque a vida está aí, as pessoas estão aí e elas se encontram.

Às vezes olham fotos da festa e dizem que a menina é muito bonita, perguntam se ela é minha namorada. Engulo seco e respondo que não, penso mudo que poderia ser, se eu tivesse sido mais corajoso.

Foi por um tempo, mas não é mais nada pessoal. Às vezes eu me lembro dessa história, mas é pensando muito mais em mim do que nela. Ela seguiu o curso do rio e chegou ao mar com meu amigo advinhador. Eu, hoje, procuro alguém com quem exercitar meu aprendizado.

quinta-feira, dezembro 02, 2004

Estou cansado. Mente cansada, corpo cansado. Já é Dezembro, uma piscadela e o ano acaba. O ano acaba, mas o esforço se extende um tanto mais: até o fim de janeiro estarei respondendo a provas de vestibular. A trajetória já dura 10 mêses e estou cansado.

Tenho uma vontade enorme de viajar. Esquecer a realidade por um tempo e me preocupar somente em me divertir. Dormir bem, acordar às 10 da manhã, ouvir pássaros cantarem e tomar banho de mar.

Em algum lugar, terei que encontrar energias para me empurrar até o limite. Estou numa batalha de nervos.

Depois, a resilência.