domingo, junho 29, 2003

Estava na casa da minha vó com meu pai que veio para Salvador passar o feriado do São João, o qual só é feriado aqui. Por isso me ausentei por esse tempo. E ontem eu não estava inspirado para escrever. E hoje não sei se estou muito. Está abafado aqui. Estou com a sensação de que devo simplesmente não fazer nada... De que devo deixar esse domingo para não fazer nada. É. Funciona porque eu não tenho nada mesmo para fazer. Meus telefonemas deram errado.

Acho que vou sair sozinho. Há quanto tempo não faço isso? Isso que era para mim hábito. Isso que era de minha competência. Eu não consigo mais me divertir sem companhia. Na verdade eu nunca mais tentei. Eu estou cercado de pessoas. Eu estou recebendo ligações de mulheres interessadas. Tá. Isso tudo é legal. Eu me tornei um cara mais social sem me tornar superficial. Tenho mais relações e são relações sólidas. Exceto pelas mulheres interessadas.

Uma menina da minha sala aparentemente se apaixonou, talvez num nível pequeno, por mim. Como isso é muito raro eu resolvi dar uma chance à menina, mas não deu mesmo. Amor por retribuição não existe. Eu não consigo mentir. Isso é uma qualidade, eu acho. Sou verdadeiro comigo mesmo... Aí vem um amigo meu e me diz uma célebre frase:

"Enquanto eu não encontro a pessoa certa, eu me divirto com as erradas."

Isso pode até funcionar com a maioria dos homens, mas não funciona muito bem comigo... Ficar com as meninas é legal e tal... Mas é só de brincadeira. É tão divertido como jogar uma boa partida de futebol ou dançar alucinadamente numa rave.

Não sei... Não sei... Quando eu me inspirar escrevo mais... Mas não hoje.

Quando eu aprender a falar de amor

Meu quarto bagunçado
Papéis ao léo, versos
Cadê meu dicionário
Quero a palavra agora

Um som preenche o ambiente
Está no quarto inteiro
Bagunça meus cabelos
Desarruma meus lençóis

Dia lindo, céu limpo
Do lado de fora da janela
Vento balança as folhas
Mas não vem me refrescar

A chave de minha porta
Tenho só eu, tranquei
Este segundo inteiro
Tenho só eu, não entrarás

E mais tarde
Quando eu aprender a falar de amor
Eu posso sair a bater nas portas
Com bom dia, flores e um sorriso

Só mais tarde
Quando eu encontrar algum meu bem
Eu posso abrir minhas portas e abrir mão das chaves
O vento passará com o cheiro das flores e abrirá meu sorriso

quinta-feira, junho 19, 2003

Nós, os humanos, nos importamos muito com coisas inúteis no nosso dia-a-dia. Quando eu era criança eu não entendia porque os adultos bebiam cerveja tão devagar e não lutavam pelos preciosos amendoins na mesa. Hoje eu sei que beber cerveja não é para matar a sede. Hoje eu sei que comer mais ou menos amendoins não faz a menor diferença... Mas tem gente que parece ainda se importar com essas futilidades.

É a alma humana que é assim mesmo. Alguma coisa não deu tão certo assim na síntese das proteínas que nos deram a origem e nós acabamos ficando assim. Vaidosos e gananciosos. Nunca estamos plenamente satisfeitos. É da natureza do homem querer mais do que o que se tem. E o que se tem? Dinheiro, computador, carro? Respeito, realização, amigos? É uma questão de valores que se perderam para a maioria de nós, os humanos.

Não é saudável se apegar às coisas táteis. Nos prendemos a elas e além disso, tudo de material é efêmero. E tudo de material é extremamente valorizado pela sociedade em que eu vivo. O velho clichê do "ter substituindo o ser". Velho porém válido. Dinheiro é uma merda. Dinheiro guardado não vale nada. Dinheiro na mão de um só não vale nada. Foi o homem mesmo que deu valor ao dinheiro para achar alguma justificativa para se achar melhor que os outros. O homem é ganancioso e naturalmente compete com seu semelhante. O homem precisa de poder.

Quem tem mais dinheiro é o mais forte. Dinheiro compra comida, mas como é que pode? Comida nasce da terra. Do chão. E de quem é o chão? Quem deu o chão a este homem? O que ele tem que eu não tenho? Dinheiro. O dinheiro separa as pessoas. Para mim o dinheiro só é útil, na microescala da minha vida, quando eu posso dividí-lo com outras pessoas. Não é dando 10 centavos a cada um, é comprando uma pizza para todos comerem se divertindo, pagando a entrada do cinema para um amigo que não pode pagar... E eu não cobro depois.

Este não é um texto a favor do comunismo. Eu não acho que esse sistema funcionaria justamente porque os humanos não suportaríam serem todos iguais. Em cuba, o povo está quase todo no mesmo patamar. Quase todo. A família de Fidel Castro vive, come e bebe do bom e do melhor. Ele é só mais um ser humano com poder. Como disse-me um dos comentadores, o homo sapiens sapiens não é o último estágio da evolução humana. A micro-consciência individual é só o começo.

segunda-feira, junho 16, 2003

Meus pais não me forçaram a ir para a igreja aos domingos. Eu não experimentei toda a ostentação do ouro das igrejas católicas de Salvador, a cidade com o maior número de igrejas no mundo: 365. Quando eu era criança e não tinha as respostas, a fé não pode me consolar. Eu conheci a teoria do Big Bang antes de conhecer o gênesis.

Nenhum tio ermo me iniciou em nenhuma religião pagã. Eu nunca participei de nenhum ritual de iniciação em córregos no meio do mato. A primeira vez que vi um pentagrama foi no símbolo de um jogo de PC chamado Pagan, Ultima VIII. Para mim era só isso. Eu não conheço o nome dos Deuses supremos da magia branca ou negra. Eu não controlo as energias ao meu redor.

As mães dos meus amigos nunca conseguiram me levar para centros espíritas. Eu nunca senti a presença de almas ao meu redor. Meus dentes não batem de frio à 30º quando algo ruim está para acontecer. Nenhuma alma me achou conviniente para levar mensagem à alguém. Nem para me pertubar o sono. Nem para me meter medo. A brincadeira do copo comigo nunca dava certo.

E tudo isso me faz, hoje, uma falta enorme. Eu não tenho uma religião. Eu não tenho em que acreditar e acredito em quase tudo. Estou cansado dos livros de física e das teorias da super interessante para explicar o que ocorre no cérebro da pessoa quando ela tem fé. Eu quero ter uma fé. Eu quero ter algo em que me apoiar... E não venham me dizer que isso é perdição da racionalidade. Eu estou cansado de ter uma explicação científica para tudo. A vida não é só isso que se vê.

Eu já senti energias fortes. Eu já senti um lugar me incorporando como o chão incorpora uma semente e a árvore brota do chão. E eu não faço a menor idéia do que isso é... Eu sei que não vou encontrar um livro com todas as respostas. Nem quero um que prometa isso. Eu quero algum sustento para a minha alma.

sexta-feira, junho 13, 2003

Luzes, sons, meninos e meninas de preto expressando amor por bandas que provavelmente mal conhecem, outros mais eruditos, penteados estranhos. Um teatro. A Máquina do Som estava começando. Meu nervosismo começava a atacar. Em breve estaríamos no palco tocando nossa canção, tentando mostrar nosso valor para um público de alguma forma exigente. Mas eu já estava lá bem antes disso.

Cheguei 4 horas antes do início real do evento. Conheci os bastidores, ajustei todos os equipamentos de som, volume da voz, violão, baixo, teclado, guitarra, bateria. Passagem de som. Fiz amizade com todos os técnicos de som, o que ainda melhorou quando estes ouviram a banda tocar para confirmar a configuração da mesa. Tínhamos opniões confiáveis do nosso lado. A passagem de som das outras bandas não tinha sido tão bem avaliada pelos conhecedores.

Chegou finalmente a hora do show. Fomos a primeira das três bandas a tocar. Entramos, tocamos. Convoquei os meus colegas para a frente do palco. Não foi necessário, já estavam todos lá. Todos os conhecidos e muitos desconhecidos querendo conhecer essa banda de nome exótico "Chevete Verde". Agradamos e agradamos muito. Pulavam! "Viva toda a expressão artística baseada em sentimentos reais e não em motivos capitais. Viva o cenário alternativo baiano!" Eu dizia ao microfone nas pausas da melodia. Aplaudiam! Sucesso!

As outras duas bandas tocaram. A terceira foi um grande fiasco. Fora de cogitação. Estava entre nós, da Chevete Verde e eles da Revel. Eu não tinha a menor idéia de qual de nós era o favorito. Estávamos, na minha opnião, no mesmo páreo. Os jurados subiram ao palco. "Antes dizer qual das bandas se classificou para a final da Máquina do Som, gostaria de destacar alguns músicos: O guitarrista da banda Revel, o baixista da Verve Mecânica e o cantor da Chevete Verde."

O cantor da Chevete Verde sou eu. Aquilo tinha me felicitado um pouco, mas eu esperava mesmo pelo resultado final. Era só o que importava para mim. Depois que o resultado final foi anunciado, várias pessoas vieram me dizer que não concordaram, que os juízes erraram. O público era quase unânime: a decisão estava errada.

Se estava errada de fato, então ótimo porque nós não ganhamos. Não ganhamos a passagem para a final da máquina do som mas ganhamos o público. Ganhamos a simpatia de membros de outras bandas. "Quando eu vier tocar na Máquina vou dizer que estou tocando em nome da Chevete Verde que foi injustiçada."

É isso que vale a pena. O público. A valorização no cenário. Uma das bandas cujos membros nós conhecemos lá se interessaram em fazer um show conjunto com agente. Estamos entrando de cabeça. E como eu falei no final da música: "O Chevete Verde continuará rodando."

terça-feira, junho 10, 2003

Daqui a dois dias estarei passando por um ponto importante da minha carreira musical. Se tiver sucesso darei passos importantes, senão volto algumas casas no jogo. O sucesso não depende só de mim nem dos outros membros da banda. Vamos fazer nossa parte com dignidade, mas haverá duas outras bandas em situação parecida. É a grande Máquina do Som. Reduto cultural dos estudantes de Salvador.

A Máquina do Som é um evento multi-cultural idealizado por dois professores secundaristas que ouvem Rock'n Roll de qualidade e viam a juventude sem espaço. Todo mundo precisa de espaço. Eles então criaram esse espaço. Já é o quarto ano da Máquina e é um sucesso. Ir ao Teatro Módulo numa noite de Quinta-feira é obrigatório para os estudantes que querem interagir com o espaço.

Funciona assim: se você souber fazer qualquer coisa interessante, como dançar, cantar, assobiar, andar com um pé só ou fazer caretas engraçadas, você entra em contato com o grêmio de sua escola, eles te inscrevem no evento e você está lá. Vai mostrar a sua arte.

Claro que o grande trunfo do evento é o concurso de bandas. Em cada programa duas ou três bandas tocam e uma delas se classifica para a final do evento que acontece em meados de outubro. O vencedor grava CD, video-clipe e acaba ficando conhecido no cenário altenativo...

Eu vou tocar nessa quinta-feira. Está no cartaz da divulgação: "Banda Chevete Verde (Colégio Dois de Julho)"... Estou ansioso... E é assim que vou passar o dia dos namorados, tocando para outros casais. Mas não cantarei uma canção de amor nem de ódio. O público geralmente pede uma canção de revolta, darei-lhes uma. "O Homem Amarelo, O Homem de Argila" é a música. Já postei a letra aqui.

Em homenagem à minha solidão nesse, e em todos os dias dos namorados até agora, escrevi isso:

Nada Houve

Procurando algo ainda branco
Para fazer retrospectiva do nada que houve
Esperança de ter criado alguma lembrança
Como pude perder o que nunca tive?

Lembro-me de nada
Nada houve

Criando a memória do detalhe do vestido
Usado no baile em que não dançamos
Não consegui entrar no cobiçado salão
Como pude perder o convite?

Ouço nada
Nada tocou

Querendo fazer as pazes pois estava errado
Na discussão infantil que nunca tivemos
Não quis enxergar o que estava claro
Como pude fechar os olhos?

Vejo nada
Nada passou

Sangrei um vermelho que nada pintou
Chorei poesias que ninguém ouviu
E não houve quem consolasse meu pranto
Meu passado está em branco

sexta-feira, junho 06, 2003

Em um certo momento essa semana fui vestir uma camisa e calçar as sandálias ao mesmo tempo. Vesti a camisa com as costas na frente e nas sandálias coloquei os pés trocados. Só aí me dei conta de como eu estava apressado e em atividade exagerada. As últimas semanas foram cheias de atividades. A vida era um trator e eu corria na frente dele para não ser atropelado. E o corpo não aguenta essa ininterrupção.

Eu não tinha tempo para respirar. Não podia cochilar logo após o almoço. Nem mesmo o domingo eu me reservei para o descanso, mesmo que o tenha reservado para a diversão. Segunda, terça, quarta. Dias lotados em cada um dos minutos até o final da noite. O dia inteiro no colégio em atividades escolares. A noite lendo Senhora, de José de Alencar, para avaliação no sábado (amanhã). Uma horinha para me dedicar à literatura virtual que encontro nesse universo. Depois o sono. Sono por exaustão total e só até que esta esteja terminada. Depois recomeça o dia.

Depois do incidente com as sandálias, de ataques de tosse e a ameaça de um resfriado concluí que eu precisava urgentemente de descanso. Precisavam que o tempo passasse por mim sem que eu precisasse correr para alcançá-lo e vencê-lo em corrida irracional.

Assim passou a quinta-feira harmoniosamente. Ainda no colégio durante a tarde, porém em atividades mais levianas. Conversando livremente com os amigos que amo sobre assuntos nada complexos. Gargalhadas soltas, nem um sinal da tosse, sandálias nos pés certos. Estava tão distraído que perdi o meu guarda-chuva. Continuei lendo Senhora à noite, mas em atividade de lazer. Sem me preocupar com o teste.

Hoje de manhã acordei estranhamente descansado. A explicação veio quando olhei para o relógio. Marcava que eram 7 horas e mais alguns minutos. Eu estava atrasado. Perdia já a primeira aula mesmo, então passei tranquilamente pelas minhas atividades matinais corriqueiras, só que uma hora depois.

Tive o prazer de fazer um teste de matemática no colégio. Com certeza acertei todas as questões. Depois só assisti à aula de Inglês quando houve uma atividade para pontuação. Me dei ao luxo da irresponsabilidade e não assisti à outras duas aulas na companhia desses mesmos amigos. A aula que estava ansioso para assistir, a de redação, não aconteceu. A pressão da professora baixou e os alunos, muito solidários, deixaram-na ir.

Nada de tosse por hoje. Sandálias nos pés certos. O tempo passa por mim correndo e eu ando a passos largos serenamente. Pretendo continuar tratando o tempo dessa forma. Eu sou o senhor do tempo que passa por mim, e não ele o meu.

segunda-feira, junho 02, 2003

Versos? Não sei. Um fluxo:

Diante de tanta energia
Eu me encontro em letargia poética
Mesmo que ainda pulsem
(e pulsam com força)
As maiores sensações

Mesmo que eu seja
Só um camponês
Num grande feudo
Alimentando um nobre
Que nem me chama pelo meu nome

E o que eu significo
Para outros mil e dez?

Eu sou um só
E cada um é
Individual

Nossos egos carentes de vaidade
Beleza, luxo, poder
Subordinação dos menores

Me dá raiva. Eu fluxo.

Se o fluxo natural da humanidade
Só leva à destruição dos semelhantes
Em nome do ouro dos tolos

O homem deu valor ao ouro
porque tinha ouro que outro não tinha
O homem deu valor ao ouro
Matou e roubou o outro que tinha

E reis fazem isso
E padres fazem isso
E eu e você seremos tentados a fazê-lo

Os humanos são mesmo conscientes?
Minha vantagem são os meus dedos que se opõem
E não ser agudo nem grave
Esse é o tom e a partitura
Do fluxo dos homens num pedaço do tempo infinito